Opinião: não é correto afirmar que proteínas vegetais estão associadas a doenças cardiovasculares

Artigo sobre ultraprocessados que repercutiu na mídia induz ao erro e gera desinformação Nos últimos dias, um estudo publicado pela revista científica The Lancet trouxe à tona discussões sobre o impacto dos alimentos ultraprocessados na saúde. Feito por pesquisadores do NUPENS (Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde) da USP (Universidade de São Paulo), em parceria com o Imperial College London e a IARC (Agência Internacional de Pesquisa em Câncer), o estudo tem sido amplamente divulgado por veículos de mídia nacionais e internacionais, inclusive com manchetes em grandes jornais. Como uma organização filantrópica sem fins lucrativos, nós sempre defenderemos a liberdade de imprensa e consideramos imprescindível que os assuntos de utilidade pública sejam abordados com o objetivo de informar e dar subsídios para que os cidadãos e cidadãs tenham condições de fazer escolhas que se adequem aos seus valores e objetivos de vida. É crucial, portanto, que discussões sobre a alimentação e saúde pública sejam baseadas em dados, evidências e estudos científicos robustos para não gerar desinformação, pânico, e, neste caso, descredibilizar uma indústria de alimentos que se propõe a criar um sistema alimentar mais positivo para as pessoas e o planeta. Neste artigo, buscamos contribuir com a discussão, trazendo novos pontos de vista através outros estudos que se contrapõem aos abordados no estudo em questão e fornecendo uma perspectiva mais ampla sobre os alimentos vegetais análogos à carne: O estudo investigou o impacto dos alimentos ultraprocessados na saúde, e é importante destacar que os alimentos vegetais análogos à carne representaram uma fração extremamente pequena (0,2%) da ingestão total de calorias da dieta dos participantes do estudo. Os principais grupos de alimentos vegetais ultraprocessados que contribuíram com a maior parte das calorias foram pães industrializados embalados (9,9%), tortas, pães e bolos (6,9%), biscoitos (3,9%), margarina e outros spreads (3.3%), salgadinhos industrializados (2.8%), produtos de confeitaria (2.7%), cereais matinais (2.7%) e refrigerantes e bebidas e sucos de frutas (2%). Carnes ultraprocessadas de origem animal representaram 2,8% das calorias consumidas, e somando os produtos lácteos de origem animal, esse número sobe para 8,8%. É do conhecimento comum que pães, biscoitos, salgadinhos, bolos, doces e refrigerantes devem ser evitados na dieta do dia a dia, então este estudo não trouxe nenhuma surpresa, porém algumas manchetes na mídia nacional e internacional que extrapolaram os resultados para sugerir que a carne vegetal, que representou apenas 0,2% das calorias consumidas pelos participantes do estudo, acarreta no aumento dos riscos para à saúde. Portanto, associar os resultados desse estudo diretamente aos alimentos vegetais análogos à carne é um equívoco que pode levar a conclusões inadequadas. Em resposta ao estudo, especialistas em nutrição e dieta da Science Media Culture fizeram um excelente trabalho ao esclarecer os problemas com a cobertura da mídia, bem como algumas falhas na metodologia do estudo, ambas podendo levar a mais confusão entre os consumidores. Os especialistas expressaram preocupação com a abordagem da imprensa sobre o estudo, observando que ela poderia dar a falsa impressão de que alimentos vegetais análogos à carne estão associados ao risco de doenças cardiovasculares. Segundo o nutricionista Dr. Duane Mellor, “Isso não é o que o artigo mostra”. Os resultados do estudo indicam que uma maior ingestão de alimentos vegetais não ultraprocessados pode reduzir riscos de doenças cardiovasculares. Sugerem também que o grau de processamento dos alimentos deve ser um critério de escolha de alimentos e que a relação entre a contribuição dietética das carnes brancas (todos os alimentos, exceto carne vermelha) e o risco de doenças cardiovasculares depende do grau de processamento dos alimentos. Diante das conclusões do estudo publicado na revista The Lancet e deixando claro que não há dados suficientes para associar os alimentos vegetais análogos à carne aos riscos de doenças cardiovasculares pela ínfima contribuição desses alimentos na dieta da população avaliada, trazemos mais elementos a essa discussão de ultraprocessados, no qual um estudo inédito, recém publicado na Current Research in Food Science concluiu que a classificação NOVA, que utiliza o grau de processamento para definir se os alimentos são ultraprocessados ou não, não foi capaz de diferenciar efetivamente os alimentos vegetais análogos à carne com baixa qualidade nutricional (alto teores de sódio, gordura saturada e calorias) dos de boa qualidade nutricional (os que contém fibras, proteínas e gordura e sódio dentro dos limites aceitáveis). O estudo foi realizado a partir da avaliação das informações nutricionais de rotulagem de 349 alimentos vegetais análogos à carne comercializados no Brasil, tais como hambúrgueres, almôndegas, empanados, embutidos, kibe, kaftas, salsicha, linguiça, mortadela, bacon, entre outros. Para avaliar a qualidade nutricional dos alimentos vegetais análogos à carne, diferentes indicadores foram utilizados, entre eles o NutriScore, a classificação NOVA e o Perfil Nutricional estabelecido pela RDC 429/2020 da ANVISA. Os resultados do estudo demonstraram que a qualidade nutricional dos alimentos vegetais análogos à carne foi melhor representada por indicadores como NutriScore e Perfil Nutricional estabelecido pela RDC 429/2020 da ANVISA do que pela NOVA. De acordo com os resultados, tem-se que (i) 80% dos alimentos vegetais análogos à carne foram consideradas de boa qualidade comparado com apenas 19% das de origem animal pelo NutriScore, (ii) 68% como de boa qualidade nutricional, comparado com 20% dos de origem animal pela RDC 429/2020 (ANVISA) e (iii) 73% como ultraprocessado, comparado 92% dos de origem animal pela NOVA. O fato de ambos os produtos de origem animal e vegetal se classificarem como ultraprocessados, mas terem resultados diferentes nos outros indicadores de qualidade nutricional, demonstra que o conceito de ultraprocessado não representa adequadamente os atributos de qualidade nutricionais dos alimentos vegetais análogos à carne. Assim, mesmo sendo classificado como ultraprocessado, em função do grau de processamento de seus ingredientes, os alimentos vegetais análogos à carne se diferem nutricionalmente dos demais alimentos ultraprocessados, sejam de base vegetal ou animal (alimentos que foram alvo do estudo mencionado na reportagem publicado na revista The Lancet). Portanto, não é adequado classificar e avaliar a qualidade nutricional dos alimentos vegetais análogos à carne da mesma forma que são classificados e avaliados os ultraprocessados. Colaborando com isso, vários
Tem menos carne e mais proteínas alternativas no prato do brasileiro, afirma estudo

34% dos brasileiros que diminuíram o consumo de carne no último ano substituem o alimento por carnes vegetais. Com o tema “Saúde para Todos” é celebrado hoje, 7 de abril, o Dia Mundial da Saúde. Dentre outros temas relevantes, a data convida a sociedade a refletir sobre as urgências de saúde provocadas pela crise climática, cujo principal agravante é a produção e o consumo de proteína animal. Para além de questões relacionadas à sustentabilidade, diminuir o consumo de alimentos de origem animal, especialmente a carne, também pode trazer outros benefícios, como a redução do consumo de gordura saturada, sódio e colesterol. Para muitas pessoas, no entanto, deixar de comer carne significa abandonar hábitos e tradições alimentares. Por isso, além de vegetais, frutas e grãos, cada vez mais brasileiros têm substituído os produtos de origem animal pelas proteínas alternativas. Sabendo que para a maior parte das pessoas a redução no consumo de carne está relacionada a motivos de saúde, essa indústria tem buscado produzir alimentos análogos mais saudáveis para todos os momentos do dia. Mudança no hábito do consumidor Em 2022, 67% dos brasileiros reduziram seu consumo de carne (um aumento expressivo de 17 pontos percentuais em relação a 2020) e 36% o fizeram por alguma questão relacionada à saúde, como colesterol alto, sobrepeso, má digestão ou desejo de melhorar a saúde no geral. 34% dos consumidores que diminuíram a quantidade de carne no prato a substituíram somente ou principalmente por carnes vegetais, 9 pontos percentuais a mais do que em 2020. Entre os brasileiros que cortaram a carne por causa da saúde, 40% utilizam a carne vegetal como substituto principal ou exclusivo. Esses e outros dados levantados pela Pesquisa de Consumidor do GFI Brasil de 2022 indicam que o brasileiro já sente os benefícios de uma alimentação com menos (ou sem) carne e que não possui intenção de voltar a consumi-la no mesmo nível de antes, uma vez que 46% dos consumidores que já reduziram a carne afirmam que pretendem manter esse nível de consumo mais baixo e 47% pretendem reduzir ainda mais no próximo ano. Entre os entrevistados que pretendem reduzir a carne nos 12 meses seguintes (independentemente de já terem reduzido ou não reduzido antes), a saúde foi o principal motivo para uma intenção de redução futura (50%), seguido pelo aumento do preço da carne (20%) e pela preocupação com os animais (16%). Por mais que a curiosidade seja o fator que impulsione 47% das primeiras compras de uma alternativa vegetal análoga, 33% dos consumidores decidem experimentar esses produtos porque estão em busca de uma opção mais saudável, o que demonstra que uma parcela da população brasileira já entende que essas alternativas proporcionam momentos de prazer, confraternização e tradição, mantendo os mesmos hábitos, mas de forma mais saudável. Opções mais saudáveis Essa, no entanto, é uma noção muito recente e, para embasar ainda mais consumidores nas suas escolhas e os legisladores nas formulações de suas diretrizes, o GFI Brasil desenvolveu o artigo “Estudo Nutricional: análise comparativa entre produtos cárneos de origem animal e seus análogos plant-based”, comparando a composição nutricional e os aditivos utilizados nas formulações dos produtos de origem animal com os seus análogos feitos de plantas. Os resultados do estudo demonstraram que produtos cárneos de origem vegetal apresentam aspectos nutricionais superiores aos produtos tradicionais com relação a teores de gordura saturada, sódio e fibra. A análise foi feita a partir de dados coletados nos rótulos de almôndegas, empanados, hambúrgueres, linguiça e quibes de origem animal e vegetal. Entre os resultados, apenas 33% dos produtos vegetais registraram alto teor de gordura saturada e sódio, enquanto 50% dos produtos tradicionais apresentaram alto teor desses componentes. Dos produtos cárneos plant-based, 76% puderam ser considerados fonte de fibra, contra apenas 4% dos produtos de carne animal. Além disso, a média de aditivos alimentares foi maior nos produtos cárneos tradicionais (chegando ao valor médio de 5 aditivos por produto analisado), do que nos produtos vegetais (média de 3 aditivos). Mesmo quando processadas da mesma forma que seus análogos de origem animal, as alternativas vegetais tendem a ser uma opção mais saudável porque, em muitos casos, é no processamento desses produtos que se suplementa nutrientes como cálcio, ômega 3, vitaminas D, B12 e outras. “Sempre que compramos esses produtos devemos analisar a qualidade das informações nutricionais presentes na rotulagem e não a quantidade de processos que o alimentou passou. Muitos alimentos considerados saudáveis, como pão integral, iogurte, queijo, atum e até alguns tipos de carne, também passam por processos fundamentais para garantir que características sensoriais e de segurança do alimento não sejam comprometidas”, explica Cristiana Ambiel, gerente de Ciência e Tecnologia do GFI Brasil. Ao buscar entender a percepção do brasileiro sobre alimentos ultraprocessados, a Pesquisa de Consumidor concluiu que quanto maior é o grau de informação sobre esses produtos, maior é a frequência de consumo de alternativas vegetais análogas. “Ou seja, quanto mais informado é o consumidor sobre alimentação e saúde, mais ele tende a escolher produtos de origem vegetal”, complementa Camila Lupetti, especialista de engajamento corporativo do GFI Brasil. Em um estudo realizado pela Escola de Medicina de Stanford, cientistas compararam o consumo de carne vegetal e animal e concluíram que, ao consumir a opção feita de plantas, os indivíduos avaliados tiveram melhoras em vários fatores de risco de doenças cardiovasculares (como diminuição do colesterol, peso corporal, gordura saturada) e elevaram a ingestão de fibras sem mudar o nível de sódio e proteína na dieta. “Vivemos em uma sociedade em que a garantia da segurança alimentar e dos alimentos está muito ligada aos processos industriais, que permitem a comercialização e o armazenamento dos produtos por períodos mais longos. Por isso, é muito importante que as empresas utilizem tecnologias que permitam desenvolver alimentos com valor nutricional elevado e rótulos fáceis de serem entendidos, de modo que as pessoas tenham condições de fazer as escolhas que mais se adequam às suas necessidades. Com a inclusão de proteínas alternativas a uma dieta