Plano de Estratégia Alimentar do Reino Unido propõe que os britânicos comam menos carne

O Reino Unido acaba de lançar a segunda parte de sua Estratégia Alimentar Nacional, um relatório de 176 páginas desenvolvido para embasar a criação de um sistema alimentar que seja melhor para as pessoas e para o planeta. Entre as principais recomendações está a redução do consumo de carne em 30% na próxima década. De acordo com o relatório, apesar de 85% das terras agrícolas do Reino Unido serem utilizadas para a criação de animais, a produção de carnes, ovo, leite e derivados fornece apenas 32% das calorias consumidas pela população. Por outro lado, os 15% restantes que são usados para o cultivo de plantas para consumo humano fornecem 68% das calorias consumidas pelos britânicos.

Além da eficiência na conversão de calorias, o relatório também aponta para o impacto que a produção e o consumo de carne têm sobre a saúde humana e planetária. O Plano afirma que o gado, por exemplo, emite 25 vezes mais gases de efeito estufa que a produção de tofu. Diz ainda que, à medida que o consumo de carne cresce, aumentam também as operações agrícolas intensivas ligadas ao uso excessivo de antibióticos e contaminação da água. Segundo o relatório, o número de fazendas pecuárias intensivas aumentou 25% no Reino Unido em 2021.

Como uma das soluções propostas, o Plano recomenda o consumo de proteínas alternativas que mimetizam a experiência sensorial dos produtos de origem animal quanto ao sabor, textura, aroma e aparência. Estima-se que a substituição por opções vegetais e obtidas por fermentação poderia gerar uma diminuição de 20% no consumo de carne na próxima década. Não por acaso, o relatório defende que o Governo invista 50 milhões de libras no mercado de proteínas sustentáveis.

De acordo com a gerente de políticas públicas do The Good Food Institute na Europa, Ellie Walden, não há como o Reino Unido cumprir suas metas climáticas sem impor mudanças drásticas na dieta da população. “Até agora, a responsabilidade de cortar ou diminuir o consumo de carne tem recaído sobre os indivíduos. Por isso, é estimulante ver a Estratégia Alimentar Nacional focada em fazer das proteínas alternativas à escolha padrão. Os produtos análogos vegetais ou obtidos por fermentação garantem um produto com sabor e aparência similar com um custo ambiental muito menor, criando milhares de empregos verdes (que diminuem o impacto ambiental) e permitindo que as pessoas continuem comendo os alimentos que gostam”.

No mesmo caminho dos britânicos, estão os espanhóis. Ainda neste mês, o ministro do Meio Ambiente da Espanha, Alberto Garzón, também defendeu a redução do consumo de carne pelos cidadãos. Ele divulgou um vídeo pedindo aos espanhóis que reduzam a taxa de consumo semanal de 1kg para 200g a 500g de carne, a quantidade semanal recomendada pela Agência Espanhola de Segurança Alimentar e Nutrição.

Para o diretor de políticas públicas do The Good Food Institute Brasil, Alexandre Cabral, o exemplo europeu se aplica a muitas outras regiões do planeta e todos os grandes mercados produtores e consumidores de carne precisam avaliar com cautela esta problemática alimentar. “No Brasil, o ambiente industrial já se encontra bastante evoluído, com as principais indústrias de alimentos oferecendo proteínas alternativas em seu portfólio. No ambiente regulatório, o Governo vem se movendo de forma sinérgica em diferentes frentes. Do ponto de vista macro, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) desenvolve uma Política Nacional sobre sistemas alimentares contemporâneos, na qual as proteínas alternativas têm um lugar de destaque. Do ponto de vista mais operacional, ligado às estruturas de registro e inspeção, tanto o MAPA quanto a Anvisa estão mobilizados no debate da configuração desta estrutura regulatória”.

Prova disso é a Tomada Pública de Subsídios como forma de embasar os reguladores com as impressões da sociedade e do mercado sobre os elementos necessários para o marco regulatório. Na área de carne cultivada, os agentes reguladores recebem um conjunto de informações de caráter científico, ao mesmo tempo em que estão dialogando com seus colegas do exterior numa troca de experiências visando definir o perfil do marco regulatório brasileiro para o setor. “O GFI Brasil está colaborando ativamente em todas estas frentes, conectando os atores nacionais e internacionais para um ambiente de negócios competitivo e favorável à inovação”, afirma Cabral.

GFI Brasil organiza workshop sobre carne cultivada para representantes da ANVISA e do MAPA

Em março deste ano, a BRF anunciou uma parceria com a startup israelense Aleph Farms para produzir carne cultivada no Brasil, com a promessa de comercializar produtos nos supermercados já em 2024. A notícia foi recebida com entusiasmo pelo setor de proteínas alternativas, mas também levantou inúmeras questões, especialmente relacionadas ao processo de produção e regulação da tecnologia de cultivo celular. Por isso, o The Good Food Institute Brasil organizou um workshop para reguladores brasileiros, com foco nas equipes do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (DIPOA/MAPA) e da Gerência Geral de Alimentos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (GGALI/Anvisa).

Durante os dois primeiros dias de evento, realizados em 17 e 22 de junho, foram apresentadas informações sobre a técnica de cultivo celular para a obtenção de produtos cárneos, além de pontos de atenção que devem ser considerados no processo de regulação, com especial atenção às questões de segurança do processo e do produto final. O público, formado por 70 profissionais, teve a oportunidade de assistir às exposições da física e professora do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, Dra. Aline Bruna da Silva; do biólogo e professor da UniSociesc, Dr. Bruno Bellagamba; do cientista do The Good Food Institute Estados Unidos, Dr. Elliot Swartz; e do engenheiro químico e professor da Universidade Federal de Santa Catarina, Dr. Luismar Porto.

As instalações e os desafios de escala

A fim de alinhar o conhecimento sobre a técnica e deixar todos na mesma página, o professor Luismar fez um breve resumo sobre como é o processo de cultivo celular para a obtenção da carne cultivada. “Tecnicamente, estamos falando de um produto à base de agregados de células animais produzidas em biorreatores. Fundamentalmente, o processo envolve a coleta de células, que podem vir de uma biópsia ou de uma célula embrionária. Essas linhagens celulares primárias eventualmente serão utilizadas para bancos de células, para posterior expansão ou multiplicação celular em biorreatores específicos”, explicou.

Comparando a produção convencional com a produção de carne cultivada, Luismar destacou entre os principais benefícios que podem ser alcançados com a técnica, a produtividade. “O tempo que se leva para obter carne bovina é da ordem de dois anos, com uma baixa conversão nesse processo. Uma pequena parte dos nutrientes e da energia utilizada para obter essa carne é disponibilizada no final como proteína para alimentação humana. Enquanto que, para a carne cultivada, é possível obter proteína para consumo em cerca de duas semanas”. 

E os impactos apontados não se limitam a isso. Segundo o professor, há também vantagens para o meio ambiente. “Além do ganho de tempo, teremos ganhos indiretos, como a diminuição do uso de terras, não só para a criação de gado, por exemplo, mas para a plantação de alimentos para esses animais. Deixa de ser necessária a criação, o confinamento, o abate e o transporte e vai direto para o processamento, a partir dessa base biotecnológica que está muito centrada nos biorreatores”. 

Apesar de soar futurista, os biorreatores são equipamentos amplamente utilizados na indústria de bebidas e alimentos. Por exemplo, para a produção de cerveja e produtos lácteos. No entanto, os biorreatores teciduais são diferentes dos utilizados para fermentação, pois normalmente precisam atender à necessidade de que as células animais, sobretudo quando cultivadas de forma isolada, são muito sensíveis aos esquemas de agitação e mistura. “Temos biorreatores de parede rotativa, de movimento ondulatório, de cultura celular e bioimpressora. No entanto, são biorreatores comerciais, o desafio é criar um biorreator de escala industrial”.

Como resultado final desse processo industrial, espera-se obter um produto que mimetize a experiência sensorial da carne convencional em aparência, textura e sabor. No entanto, para o professor Luismar, a tecnologia de cultivo celular pode ir além. “Eu quero crer que, no futuro, não haverá um comprometimento da indústria em apenas mimetizar a carne convencional. Eu gosto da analogia de que “sorvete não dá em árvore”, e, no entanto, as pessoas preferem comer o sorvete do que os seus componentes naturais. Então, é muito possível que essa tecnologia gere um conjunto de novas estruturas à base de proteínas animais, e que não necessariamente mimetizam a carne obtida pelo processo convencional”.  

No entanto, para que tudo isso aconteça no Brasil, ao ponto de colocar o país no mapa da tecnologia de cultivo celular, é preciso acelerar as inovações e as pesquisas neste campo. “Atualmente, as iniciativas estão mais concentradas nos Estados Unidos, Europa, Israel, alguns países da Ásia, como Cingapura e China, além da Austrália. O maior gap está na África e na América Latina, com poucas iniciativas em andamento. Estamos, aparentemente, perdendo o compasso”, conclui o professor. 

Da biópsia ao biorreator

Seguindo com as exposições, o professor Bruno Bellagamba enfatizou a importância do evento. “Poder discutir todos esses assuntos do ponto de vista regulatório, com as agências reguladoras, é um momento histórico para o país.”. Em sua fala, Bellagamba apresentou aspectos relevantes sobre as primeiras etapas do processo de cultivo celular. A partir de dados do grupo de estudos do professor Mark Post, conhecido por produzir o primeiro hambúrguer cultivado em 2013, o pesquisador apresentou as duas formas de fazer a biópsia para retirada de células do animal: por agulha ou por incisão.

De acordo com o professor, a biópsia por agulha gera pouco ou nenhum desconforto ao animal e exige pouca sedação e analgesia. No entanto, obtém-se pouca quantidade de amostra de células, cerca de 0,5g, exigindo várias amostragens. Já a incisão, processo para obter músculo e tecido adiposo, garante maior quantidade de tecido, cerca de 10g a 15g, resultando em apenas uma amostragem por animal. Contudo, gera maior desconforto e exige maior dose de analgésicos e sedativos. “Portanto, também há uma questão de bem-estar animal para escolher entre um método e outro”, afirma.

Além disso, há, ainda, a questão do risco de contaminação que pode sofrer o material biológico coletado. No procedimento de coleta por agulha o potencial de contaminação é baixo porque a incisão é bem menor. Já na incisão com bisturi, seria necessário um cuidado maior com a assepsia do local onde o material será coletado para evitar contaminação com microorganismos que podem ser propagados na cultura celular posteriormente. “Do ponto de vista regulatório seria importante observar questões relacionadas ao manejo do animal, antes e após as biópsias; limitar o número de procedimentos para evitar sofrimento animal desnecessário; intervalo mínimo entre os procedimentos; quantidade máxima de tecido coletado por biópsia para se ter um bom início de cultivo, sem comprometer a saúde do animal; e o armazenamento e transporte da amostra para processamento posterior”, apontou Bellagamba.

Com relação à escolha do animal doador, também há pontos para serem considerados. “Seria um indivíduo macho, pois apresentam mais receptores androgênicos, o que garante maior proliferação celular; com alguns meses de idade, uma vez que apresentam mais células satélites; mantido em manejo extensivo, sem confinamento, para gerar menor estresse, com alimentação a base de forragem, capazes de gerar mais fibras do tipo I, que garantem contração rápida e mais células satélites. A biópsia deveria, ainda, ser feita na parte dianteira, na região do pescoço até as costelas”, indicou.

Depois que o material é coletado, precisa ser levado para um laboratório de cultivo celular para que as células sejam isoladas e multiplicadas. Cada tipo de célula precisa de um meio de cultivo com algumas diferenças, mas que sejam ricos em nutrientes e fatores de crescimento para que continuem se proliferando e permanecendo multipotentes. Segundo o professor, o processo é simples, mas precisa ser feito com cuidados de assepsia rigorosos para evitar contaminação por microorganismos. “Com relação ao cultivo em larga escala, do ponto de vista da qualidade do processo, idealmente, a cada passagem de processo, seria necessário um protocolo de qualidade específico, atentando-se a: viabilidade celular, controle microbiológico, estabilidade genética e certificação de que não estão sendo  produzidos metabólitos tóxicos que podem ser prejudiciais às amostras e à saúde humana”.

Contribuindo com a apresentação do professor Bruno e respondendo a questões trazidas pelo MAPA, o professor Luismar chamou a atenção para a sustentabilidade desse processo e à garantia do bem-estar animal. Segundo ele, uma célula embrionária é capaz de gerar milhares de toneladas de carne. “Em princípio, é possível fazer um banco de células primárias e um outro banco de células secundárias, com possibilidade de ampliá-los ainda mais. A partir delas, podem ser geradas milhares de toneladas de carne em instalações industriais, de forma que, em tese, uma única célula-tronco pode ser utilizada por dez anos em uma produção de larga escala. Ou seja, não vai ser necessário fazer biópsias com frequência.

Com relação aos meios nutritivos, Luismar ponderou que já há alternativas ao soro fetal bovino, utilizados nas primeiras experiências com carne cultivada. “As propostas de comercialização de meio nutritivo, partem do princípio de que não serão utilizados soro fetal bovino, pois esse seria um contraponto muito forte em relação aos direitos dos animais. Também há claims que já apontam para um domínio tecnológico e patentes, de que não serão utilizados antibióticos em nenhuma parte do processo. É claro que isso é um grande desafio, que precisa ser provado em larga escala, mas as propostas que estão surgindo vão nessa direção. Por isso, do ponto de vista regulatório, será necessário criar mecanismos de controle das matérias-primas nas entradas desses biorreatores com relação à purificação e à ausÊncia de vírus, bactérias e fungos, assim como uma inspeção detalhada na saída”. 

Do biorreator ao bife

Contribuindo com informações referentes à próxima etapa do cultivo celular, a professora Aline destacou o principal objetivo da técnica, que é mimetizar a carne de origem animal com perfeição. Segundo ela, a engenharia de tecidos tem como meta o corte de carne do tipo prime, caracterizado por conteúdo magro e gordo (células de músculo e de gordura). “O resultado final para o consumidor deve ser de palatabilidade, garantindo aparência, suculência, maciez e sabor. Isso vai depender de como essas células de músculo e gordura estarão distribuídas para formar esse tecido tridimensional. Por isso, precisamos entender a estrutura da carne (músculo esquelético), que tem uma composição aproximada de 90% de fibras musculares, 10% de tecidos conjuntivos e gordurosos e 0,3% de sangue”.

Isso leva a uma etapa fundamental do processo, que é a maturação das células, logo após a sua expansão em um biorreator. “A maturação também pode ser feita em um biorreator, por meio de uma estrutura tridimensional que vai mimetizar a matriz extracelular natural, chamada de scaffold, gerando posteriormente pedaços inteiros como um bife. Também pode ser utilizado materiais bidimensionais para gerar um agregado de células, que depois podem ser estruturadas em carnes processadas, como uma carne moída, por exemplo”.

Vale destacar que essa matriz extracelular (scaffold), que nada mais é do que a parte acelular de qualquer tecido ou órgão, tem a função de dar suporte mecânico para as células, com pontos de adesão, para que as células possam aderir, e, depois, na fase de maturação, se diferenciar no tipo celular adequado. Além disso, precisa ter características físico-químicas e mecânicas similares às células, bem como porosidade para que as células possam crescer, se expandir e formar uma estrutura tridimensional. “Um dos pilares da engenharia de tecidos é desenvolver de forma sintética essa matriz extracelular, que pode ser diferente para cada tipo de tecido que se pretende produzir. Existem muitas formas para se fazer um scaffold, como a partir de nanofibras poliméricas biodegradáveis, por exemplo”.

Além dessas características, Aline também defende que os scaffolds sejam de origem vegetal, comestíveis, baratos, com processamento escalável, e com resistência mecânica compatível com as tensões geradas no interior do biorreator. Outras possibilidades de materiais para produção de scaffolds são: alginato, gelatina, quitosana, proteína de soja, celulose, micélios fúngicos (quitina, celulose, proteínas), frutas ou vegetais descelularizados, etc.

Outro ponto importante a se destacar é a vascularização da carne cultivada, uma vez que os tecidos musculares são ricos em redes microvasculares. No entanto, do ponto de vista técnico, segundo Aline, os vasos sanguíneos podem não ser um componente essencial do sabor ou da textura da carne. “Por isso, o que tem se pensado é substituir a rede de vasos por biorreatores de perfusão, que podem fazer o papel das redes microvasculares”.

Finalizando a sua apresentação, a professora citou alguns lançamentos do mercado internacional, chamando a atenção para as carnes híbridas. “Os primeiros lançamentos não são 100% carne cultivada. A carne de frango da EatJust, já regulamentada em Cingapura, tem 70% de frango cultivado e 30% de base vegetal. Também temos a Super Meat, empresa israelense que fabrica produtos plant-based, que propões adicionar até 30% de células cultivadas ao produto vegetal. Isso deve conferir sabor e conteúdo nutricional. A Higher Steaks, startup britânica que produziu um protótipo de bacon, utiliza 50% de células musculares e 50% de scaffold à base de plantas, proteínas e gorduras vegetais. Com relação à bioimpressão, a KFC firmou uma parceria com a empresa russa Bioprinting Solutions, para desenvolver empanados de frango com tecnologia de bioimpressão, utilizando células de frango e material vegetal. Já a Aleph Farms anunciou que produziu um bife por bioimpressão em fevereiro deste ano”.

Segurança de alimentos e considerações sobre o impacto ao meio ambiente

Dr. Elliot começou sua fala apresentando a linha do tempo da carne cultivada, que teve início em 2013, com o primeiro hambúrguer cultivado, desenvolvido pelo já mencionado professor Mark Post, na Holanda. De lá pra cá, já são mais de 100 empresas ao redor do mundo atuando com a tecnologia, com investimentos avaliados em aproximadamente USD $225 milhões apenas em 2020, além da primeira experiência de regulamentação ocorrida em Cingapura. Com relação às perspectivas de futuro, o Dr. Elliot aponta para um movimento crescente de processos regulatórios em todo o planeta, e avanços que possibilitem preços competitivos para a carne cultivada. E, segundo a consultoria McKinsey, até 2030,  a produção estimada de carne cultivada poderá medir entre 0,4 a 2,1 milhões de toneladas métricas. Isso significa 0,1 a 0,56% da demanda global de carne (375 milhões de toneladas métricas).

Falando sobre os impactos ambientais da produção da carne cultivada, o Dr. Elliot prevê que a tecnologia provavelmente terá uma pegada ambiental menor em comparação com a produção de carne convencional. “Se energias renováveis ​​forem usadas, a pegada de carbono cai em 80%, em relação à produção convencional”, afirmou. A projeção foi feita com base em um estudo encomendado pelo GFI e pela organização Gaia, chamado de LCA (avaliação do ciclo de vida). Com base em dados fornecidos por 15 empresas da cadeia de abastecimento de carne cultivada, foi criado um modelo de como a carne cultivada pode ser produzida até o ano de 2030, avaliando os impactos ambientais de uma instalação em escala comercial que produz 10.000 toneladas métricas de um produto de carne cultivada por ano. Para nutrir as células, seria utilizado um meio livre de antibióticos e soro, incluindo apenas aminoácidos derivados principalmente de hidrolizado de soja e suplementadas com aminoácidos de fermentação e síntese química; glicose de milho; proteínas recombinantes e fatores de crescimento produzidos por fermentação. 

Seguindo o modelo, os impactos do aquecimento global seriam diminuídos em 17%, 52% e 85% a 92% em comparação à produção convencional de frango, porco e boi, respectivamente. Também foi possível comprovar que a carne cultivada é 3,5 vezes mais eficiente do que o frango convencional, que é a mais eficiente dentre as carnes convencionais, na conversão de ração em carne. Por isso, a produção de carne cultivada reduziria o uso da terra em 63% a 95% em comparação com a carne convencional. Por fim, foi possível concluir que a carne cultivada também deve ser menos poluente à água, com redução de 29% a 93% em comparação com todas as formas de carne convencional, e usar significativamente menos água azul, encontrada em reservatórios de água superficial e subterrânea, com redução de 51% a 78% em relação à produção convencional de carne bovina (quase o mesmo que frango e porco).

Na segunda parte de sua apresentação, o Dr. Elliot falou sobre a segurança do processo. “De que forma o processo de produção de carne cultivada pode representar novas ameaças à segurança de alimentos para consumidores e como podemos mitigar esse risco?”. Para isso, indicou para cada etapa da produção – seleção da linhagem celular, proliferação, diferenciação e maturação, separação das células de interesse e formulação do produto final, fabricação e embalagem – algumas possibilidades para garantir que o alimento seja seguro. “No entanto, destaco que não são recomendações ou ações regulamentares formais, uma vez que alguns detalhes são hipotéticos ou estão sujeitos a alterações.”.

As orientações envolvem selecionar animais saudáveis para coleta de células, verificar se as células estão livres de agentes adventícios, prevenir a contaminação cruzada, não utilizar produtos de origem animal como meio nutritivo, limpar e esterilizar os biorreatores, utilizar materiais seguros, sem origem animal, comestíveis ou biodegradáveis para produzir os scaffolds, realizar testes para detectar a presença de alergênicos e resíduos, evitar erros durante o processo de embalagem que que possam introduzir micróbios patogênicos no produto, apresentar tabela nutricional detalhada, e realizar procedimentos de manuseio e cozimento semelhantes ao da carne convencional.

O Dr. Elliot trouxe, ainda, pontos de atenção fundamentais para acelerar o desenvolvimento da indústria de carne cultivada, e que tem relação direta com os processos regulatórios. “A falta de orientação aberta está retardando os fabricantes de carne cultivada de várias maneiras, incluindo o projeto das instalações, as especificações dos equipamentos e a compreensão dos dados necessários para coletar e enviar, além de atrasar os fornecedores de carne cultivada, incluindo fornecedores de insumos para meios de cultura de células, materiais de suporte, auxiliares de processamento e equipamentos. Um desafio contínuo será desenvolver estruturas em diferentes regiões que garantam a segurança do consumidor, sem sobrecarregar significativamente os fabricantes ou diferir umas das outras.”, afirmou.

Analisando o cenário regulatório internacional, o Dr. Elliot acredita que, depois de Cingapura, o Canadá, os Estados Unidos, a União Europeia, a Austrália e a Nova Zelândia devem ser os próximos a aprovar a regulação da carne cultivada. Enquanto isso, Japão e Israel seguem desenvolvendo a estrutura de seus documentos regulatórios. Já o Brasil, a Índia e a China estão monitorando os movimentos globalmente para definirem que estratégias vão desempenhar.

Próximos passos

O workshop segue até o início de julho, com atividades fechadas para a ANVISA  e o MAPA, entre os dias 29 e 30 de junho e 1 de julho. Neste período, o grupo irá conhecer e trocar experiências sobre processos regulatórios em carne cultivada com representantes dos Estados Unidos, Europa e Singapura. 

GFI está entre as organizações mais transparentes do mundo e recebe selo máximo do GuideStar

Mais uma vez, o GFI foi reconhecido como uma das organizações mais transparentes do mundo. Pelo quarto ano consecutivo, recebemos o Selo de Transparência GuideStar Platinum, obtido por apenas 1% das 2,8 milhões de instituições avaliadas. O GuideStar é um banco de dados com informações sobre organizações sem fins lucrativos que foi projetado para revolucionar a prática filantrópica e sem fins lucrativos, fornecendo informações que aumentam a transparência, permitem que os usuários tomem melhores decisões e incentiva doações para a caridade. O GFI recebeu esse reconhecimento por demonstrar abertamente informações sobre finanças, missão e impacto do trabalho desenvolvido. Para conferir, acesse o site do GuideStar e crie uma conta.

Quer fazer parte do nosso time? O GFI Brasil tem uma oportunidade para Especialista de Dados!

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Procuramos alguém para desenhar novos estudos com foco no consumidor, contratar e gerenciar fornecedores, elaborar e apresentar relatórios, gerenciar e fornecer dados relevantes para todos os públicos beneficiados com as ações do GFI Brasil, como empresas, investidores, empreendedores, governo e academia. Você construirá relacionamentos com institutos de pesquisa, especialistas de mercado e outras partes interessadas para entender quais são os melhores dados para apoiar o crescimento do mercado de proteínas alternativas no Brasil.

Para se candidatar é necessário bacharelado em áreas como negócios e análise de dados ou áreas relacionadas e fluência em inglês. Em relação às habilidades, procuramos alguém com pelo menos cinco anos de experiência na área, especialmente com desenvolvimento de pesquisas de consumo, com excelente capacidade de comunicação oral e escrita. Buscamos alguém que tenha alinhamento com a missão do GFI Brasil e elevado senso ético. É necessário demonstrar responsabilidade para lidar com projetos confidenciais e maturidade para trabalhar com elevados níveis de autonomia. Também buscamos alguém que trabalhe bem sob pressão e consiga gerenciar vários projetos simultaneamente, cumprindo seus prazos.

Esta posição vai liderar pesquisas sobre o consumidor e o mercado brasileiro, principalmente para produção de dados primários. Além disso, o GFI Brasil é o ponto focal para a América Latina e o Caribe, então também planejamos compilar dados sobre esta região como uma segunda etapa. No entanto, o setor de Proteínas Alternativas é muito global, por isso é necessário estar conectado com os acontecimentos e descobertas do mundo todo.

Candidate-se até 14/07 neste link. 

Tenha mais informações sobre a vaga na descrição do cargo disponível neste link.

GFI Brasil financia pesquisas para o desenvolvimento de ingredientes a partir de espécies vegetais da Amazônia e Cerrado

O The Good Food Institute Brasil lança o Projeto Biomas que vai financiar pesquisas exploratórias com potencial para transformar produtos vegetais nativos dos biomas da Amazônia e Cerrado em ingredientes alimentícios demandados pela indústria de proteínas alternativas. Com aporte de até R$135 mil por projeto, os estudos deverão se concentrar na investigação de quatro espécies amazônicas (babaçu, guaraná, cupuaçu e castanha-do-Brasil) e três do Cerrado (baru, macaúba e pequi). Os pesquisadores interessados devem enviar suas candidaturas até o dia 15 de julho de 2021, às 22h de Brasília. Os projetos deverão ter prazo de execução de, no máximo, 12 (doze) meses e desenvolvidos no Brasil.

Para se inscrever, basta ler o edital e seguir as instruções.

Por meio do programa que conta com aporte de recursos da Fundação CLUA – Climate Land and Use Alliance, o GFI espera criar ferramentas de acesso livre e métodos para o desenvolvimento de alimentos que sejam saborosos e acessíveis. “No Brasil, temos o privilégio de contar com uma vasta biodiversidade, com potencial para transformar espécies nativas de manejos sustentáveis em ingredientes para o mercado de produtos plant-based. As pesquisas deverão estabelecer caminhos para valorização, ampliação das informações tecnológicas das espécies nativas e a ampliação do uso desse enorme potencial natural como ingredientes em produtos vegetais, potencializando o desenvolvimento econômico regional”, explica a Dra. Katherine de Matos, diretora de Ciência e Tecnologia do GFI Brasil.

A seleção dos sete produtos nativos ocorreu após levantamento feito pelo próprio GFI Brasil que levou em consideração o potencial técnico e econômico de cada espécie. Para chegar aos resultados econômicos, a instituição utilizou o número de comunidades produtoras, volume de produção e maturidade da cadeia produtiva. Para a análise de potencial técnico, foram utilizados critérios como a composição química dos produtos, o potencial tecnológico e aspectos nutricionais.

“A potencialidade da flora nativa brasileira não está refletida nos supermercados, nas feiras e muito menos na cozinha do brasileiro. Como resultado, a sociedade deixa de aproveitar os benefícios decorrentes dessa riqueza. No caso das espécies de uso alimentício, por exemplo, a sociedade acaba não se beneficiando dos elevados valores nutricionais presentes nas espécies nativas. A natureza é rica, entretanto, essa riqueza precisa e deve ser usada com sabedoria. Essa pode ser a grande saída da humanidade para o futuro”, defende Cristiana Ambiel, gerente de Ciência e Tecnologia do GFI Brasil.

Entre as possibilidades de temas de pesquisa apontadas pelo edital do Projeto Biomas, destacam-se a utilização de resíduos ou subprodutos industriais ou agroindustriais, desenvolvimento e otimização de processos para obtenção de ingredientes por meio de métodos ecológicos, viáveis e simples de serem aplicados na agroindústria e associações extrativistas locais, desenvolvimento de ingredientes para aplicação em produtos feitos de plantas que melhorem as características sensoriais de aparência, cor, sabor e textura, promovam incremento nos aspectos nutricionais e reduzam o custo no produto final, além do desenvolvimento de produtos com apelo clean label, dentre outros. Para contribuir na compreensão do edital, o GFI vai promover, no dia 23 de junho, das 14h às 15h30, o workshop “Entendendo o Programa de Financiamento à Pesquisa Exploratória com foco nos Biomas Amazônia e Cerrado”.

Inscreva-se no link.

O GFI Brasil incentiva o investimento em pesquisa e desenvolvimento da biodiversidade para encontrar inovações tecnológicas que supram as demandas da indústria de forma sustentável. Desta forma, a instituição promove a conservação da floresta em pé, proporciona o desenvolvimento de novas cadeias produtivas e a melhoria da qualidade de vida das comunidades locais.

Conheça um pouco mais sobre os ingredientes selecionados pelo GFI e suas propriedades:

Com significativa produção nacional de cerca de 32.900 toneladas no ano de 2019 segundo o IBGE, a castanha-do-brasil in natura constitui uma favorável fonte proteica (15,60%) e lipídica (61,00%). O seu óleo possui uma boa qualidade nutricional (85% de ácidos graxos insaturados) e apresenta índices de acidez e peróxidos que atendem a legislação brasileira para óleos vegetais comestíveis.

A produção nacional de Babaçu atingiu cerca de 48.700 toneladas no ano de 2019 segundo o IBGE, envolvendo cerca de 37 comunidades produtoras segundo a Conexsus. A amêndoa do babaçu possui 7,25 % de proteína e 66% de lipídeos. O seu óleo apresenta características funcionais interessantes por ser constituído de 83% de ácidos graxos saturados. Este produto, destinado à alimentação humana como suplemento alimentar, e, na medicina popular no tratamento de inflamações, já é produzido e comercializado por algumas comunidades.

Com uma produção de cerca de 787 toneladas no ano de 2017, segundo o IBGE, a polpa do cupuaçu é destinada à produção de diversos alimentos (polpa congelada, sorvete, geleias, etc). Dessa produção, gera-se como resíduo as sementes. A semente do cupuaçu possui 9,4% de proteína e 64,9% de lipídeos. Do óleo extraído dessa semente forma-se uma torta com altos teores de proteína (15,2%), fibras (47,6%) e lipídeos (21,0%). A torta de cupuaçu se mostra como uma alternativa para a elaboração de isolados proteicos devido a sua riqueza de aminoácidos essenciais, tornando-se uma fonte de proteína alternativa.

O Guaraná é normalmente comercializado na forma de xarope (para a produção de refrigerantes e bebidas energéticas) e em pó (para a produção de cápsulas ou vendidos em sachês e frascos). Tanto o xarope quanto o pó são produzidos a partir das sementes torradas do guaraná que possuem cerca de 15% de proteína e 40% de fibras. Deste processo gera-se como subprodutos a casca e a polpa do guaraná. A casca possui cerca de 10% de proteína e 70% de fibra e a polpa possui cerca de 17% de proteína. Faz-se necessário o aprofundamento de estudos a cerca do aproveitamento destes subprodutos pela indústria alimentícia.

Segundo dados do IBGE, a produção nacional de Macaúba atingiu cerca de 1.178 toneladas no ano de 2018. A polpa e amêndoa de macaúba podem ser industrialmente exploradas não só como fonte de óleos vegetais, mas também como fonte de proteínas e carboidratos. Estas propriedades são desejáveis para a formulação de diferentes tipos de alimentos, com destaque para a indústria de panificação e massas e a indústria de produtos cárneos, além da importância na fabricação de suplementos alimentares.

A produção nacional de Baru atingiu cerca de 69,3 toneladas no ano de 2019, segundo o IBGE. A polpa do baru possui 6,0% de proteína; 41,6% de fibras; 3,4% de lipídeos e 22,5% de carboidratos, sendo comercializada, usualmente, na forma de farinha. A amêndoa possui cerca de 30% de proteína; 15% de fibras e 40% de lipídeos, sendo comercializada na forma de amêndoa torrada. O óleo da amêndoa de baru tem elevado grau de insaturação, sendo similar ao óleo de oliva e, portanto, com potencial para ser usado como óleo de cozinha.

O Pequi tem produção nacional de cerca de 27.183 toneladas no ano de 2019. A polpa do pequi possui 3,7% de proteína; 15% de fibras e 33,4% de lipídeos. O óleo extraído da polpa se constitui de 62% de ácidos graxos insaturados.  A polpa é comercializada na forma in natura, congelada e em conserva. Apesar de considerada uma proteína de baixa qualidade, é comparável à proteína da farinha de trigo, e pode ser adicionada de misturas para melhorar sua qualidade.

MAPA divulga Tomada Pública de Subsídios para fomentar discussão sobre produtos de origem vegetal análogos aos de origem animal

O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) divulgou hoje (11/6) uma Tomada Pública de Subsídios a fim de fomentar a discussão sobre a regulação dos produtos de origem vegetal análogos a carne, leite, laticínios, ovos e pescados, também chamados “plant based”. Segundo o texto publicado no Diário Oficial da União, o objetivo é “permitir a ampla divulgação e a participação de órgãos, entidades ou pessoas interessadas em contribuir com a discussão sobre a regulação dos produtos processados de origem vegetal análogos a produtos de origem animal”. O público interessado em participar, terá 90 dias, a partir da publicação no Diário Oficial da União. Após a finalização da tomada, o Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Vegetal vai consolidar as contribuições. Acesse o link do formulário aqui.

Este é o segundo passo do MAPA em direção a um processo de regulamentação do segmento de produtos à base de vegetais (plant-based) no Brasil. Em dezembro do ano passado, o Ministério realizou com apoio da Embrapa, um workshop sobre mercado, conceitos e pesquisas em desenvolvimento sobre o setor, com apoio do The Good Food Institute Brasil, que colaborou na definição dos temas dos painéis de debate e que participou em todos eles. 

Na ocasião, Glauco Bertoldo, diretor do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Vegetal do Mapa, disse que “a regulamentação propicia um ambiente seguro para o desenvolvimento da agricultura e das agroindústrias e uma relação saudável com o consumidor”. Já a chefe-geral da Embrapa Agroindústria de Alimentos, Lourdes Cabral, afirmou que há um “aumento da oferta de novos produtos no mercado e, nesse sentido, o Mapa precisa escutar os diversos atores desse segmento, produtores, pesquisadores e consumidores, e processar essas informações de modo a criar uma base que possa vir a auxiliar a regulamentação desse setor emergente”.

Também participaram do evento: diretor executivo do GFI, Gustavo Guadagnini; diretor de Políticas Públicas do GFI, Alexandre Cabral; diretor de Assuntos Regulatórios e Científicos da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia), Alexandre Novachi; diretor técnico da Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas não Alcoólicas (Abir), Igor Castro; e a diretora geral do Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital), vinculado à Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Dra. Eloísa Garcia.

“Se no primeiro debate houve o MAPA abriu sua escuta para associações e especialistas do setor, neste segundo passo a consulta é ampla e o MAPA se abre a qualquer colaboração vinda do setor privado, de instituições de pesquisa, associações de classe, sociedade civil organizada ou mesmo manifestações individuais que venham a colaborar na construção do marco regulatório dos alimentos à base de proteínas alternativas”, afirma Alexandre Cabral, diretor de Políticas Públicas do GFI Brasil.

Rotulagem de produtos lácteos vegetais conquista importante vitória na Europa

Líderes da União Europeia rejeitaram nesta semana uma série de propostas que restringiriam a rotulagem de produtos lácteos vegetais. Caso fossem aprovadas, as medidas proibiriam as marcas de apresentar informações essenciais sobre saúde e alergênicos, utilizar termos como “cremoso” ou “tipo iogurte”, informar os consumidores sobre o impacto climático dos alimentos, utilizar embalagens semelhantes às usadas para laticínios, como caixas de papelão, além de não poderem mais usar imagens do produto sendo servido na mesa do café da manhã. As palavras leite e iogurte seguem proibidas.

As propostas foram retiradas das negociações da UE sobre a Política Agrícola Comum depois que 21 organizações não governamentais, incluindo o The Good Food Institute (GFI), apelaram à UE por meio de uma carta conjunta. A ativista Greta Thunberg também se manifestou em suas redes sociais contra as propostas, e mais de 450 mil pessoas assinaram uma petição pedindo à UE que as retirasse.

De acordo com o diretor de políticas públicas do GFI Brasil, Alexandre Cabral, a retirada das propostas restritivas aos laticínios vegetais na Europa representa um passo adiante no respeito à liberdade de escolha dos consumidores. “O consumidor consciente faz escolhas. O crescimento do mercado de produtos à base de proteínas alternativas mostra que cada vez mais consumidores modificam suas dietas por diferentes motivos, ao passo que diminuem o consumo de produtos de origem animal. Espero que seja um exemplo para outros países, inclusive o Brasil”, afirma Cabral.

O parlamento brasileiro também analisa o assunto. Projeto de Lei 10556/2018, de autoria da Deputada Tereza Cristina (DEM/MS), propõe restrições aos rótulos de leites e derivados vegetais. Segundo o texto, o uso das palavras “leite” e todos os seus derivados, como manteiga, iogurte e queijo ficariam restritos aos produtos de origem animal. Para Cabral, “esses produtos são conhecidos pelos consumidores pelo seu uso, muito mais do que pelo seu rótulo. Esperamos que o PL seja emendado para autorizar o uso desses termos também pelos produtos feitos de plantas”. O projeto está na Câmara Federal, aguardando parecer do relator na Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços (CDEICS).

Workshop organizado pela OMS discute aspectos regulatórios e de segurança de alimentos para o setor de proteínas alternativas

Com o desafio de alimentar quase dez bilhões de pessoas até 2050, a ONU estima que será necessário aumentar a produção de alimentos em 70% caso a população global continue a consumir proteínas animais como faz hoje. Não à toa a busca por fontes alternativas de proteínas tem ganhado cada vez mais espaço nas discussões públicas, uma vez que, além de ajudar a resolver este grande desafio, ainda cria oportunidades para o agronegócio ao incluir  soluções tecnológicas como a carne cultivada e de base vegetal à indústria de alimentos. 

Tendo isso em vista, o Escritório Regional da Organização Mundial da Saúde para o Pacífico Ocidental (OMS/WPRO), com apoio das afiliadas globais do The Good Food Institute no Brasil, Estados Unidos, Índia e Ásia-Pacífico, realizou entre os dias 18 e 19 de maio um workshop para discutir questões regulatórias e de segurança de alimentos fundamentais para o desenvolvimento pleno do setor. 

Para a diretora de ciência e tecnologia do GFI Brasil, que participou da organização do evento, o Workshop representa um marco para o setor de proteínas alternativas. “As regulamentações atuais para proteínas alternativas estão aquém da demanda do consumidor e poucas práticas padronizadas ou recomendações técnicas para regulamentação internacional consistentes foram estabelecidas até agora. Uma estrutura regulatória forte é crítica para avançar ainda mais o setor e maximizar seu potencial para garantir a segurança de alimentos, mitigar a degradação ambiental e aliviar a pobreza global é fundamental. E, para isso, não podemos abrir mão dos investimentos em ciência e tecnologia”.

O workshop de alto nível apresentou cientistas, especialistas em segurança de alimentos e líderes multilaterais de todo o mundo

O encontro histórico, que contou com a participação de países membros da região do Pacífico, incluindo Austrália, Brunei, Camboja, China, Filipinas, Laos, Malásia, Mongólia, Niue, Papua Nova Guiné, República da Coréia, Cingapura, Ilhas Salomão, Vanuatu e Vietnã, representa um passo importante que permita aos Estados-Membros ter condições de regulamentar a produção, a comercialização e o consumo de produtos à base de plantas ou cultivados à partir de células, tanto locais quanto importados. 

Entre os tópicos abordados no workshop estavam: considerações de segurança de alimentos da produção de carne cultivada, visões científicas de proteínas vegetais e fermentação microbiana, insights sobre a percepção do consumidor de proteínas alternativas e um estudo de caso dos processos regulatórios inovadores de Cingapura e da Austrália. 

Para o Dr. Takeshi Kasai, diretor regional da OMS/WPRO, que fez a abertura do evento, transformar a cadeia de produção de alimentos com tecnologias alternativas será um desafio, mas também fornecerá grandes oportunidades. “É muito importante para nós ajudar os países a regulamentar essas tecnologias. A produção de carnes exige a expansão de pastagens e, com isso, causam desmatamento, emissão de gases de efeito estufa e levam ao aquecimento global. Estamos falando sobre comida, mas há muitas implicações em outros setores. Portanto, os países precisam ser capazes de contar com tecnologias alternativas para a produção industrial em massa de alimentos saudáveis ​​e ricos em proteínas de forma sustentável e ecologicamente correta”, afirmou Dr. Kasai. 

Compreender a tecnologia e o processo por trás da produção de proteínas alternativas é essencial para criar regulamentações que protejam a saúde dos consumidores e também lhes permitam fazer escolhas. “Se temos alimentos suficientes, […] alimentos seguros, mas não podemos comercializar esses alimentos, não podemos garantir a segurança alimentar.” – Dr. Guilherme Antonio da Costa Júnior, Presidente da Comissão do Codex Alimentarius.

No início deste ano, o GFI recebeu o status de observador oficial no Codex Alimentarius, um programa conjunto da FAO-OMS dedicado ao desenvolvimento de padrões globais para segurança de alimentos e comércio exterior para consumidores, produtores, processadores e agências reguladoras. Como observador, a equipe de especialistas do GFI pode agora participar ativamente do processo de definição de padrões internacionais para apoiar uma estrutura regulatória global justa e equitativa.

Adaptando a regulação de alimento para um setor em franca expansão

A emergência das nações em controlar a crise sanitária e de saúde provocada pela pandemia do Coronavírus também fizeram parte das exposições, especialmente pela necessidade de ampliar e diversificar as fontes proteicas de maneira segura. Ao explicar por que Cingapura se tornou o primeiro país no mundo a conceder aprovação regulatória para a venda de um produto de carne cultivada, Low Teng Yong, Diretor Adjunto de Política Regulatória da Agência Alimentar de Cingapura, reiterou que uma de suas principais prioridades é “diversificar as fontes de alimentos para garantir que o abastecimento seja resistente às flutuações [globais].”

Em tempos de grande turbulência, existem grandes oportunidades, e a necessidade de mudar para um sistema alimentar mais sustentável e justo nunca foi tão clara como hoje. Como o Dr. Babatunde Olowokure, Diretor da Divisão de Segurança Sanitária e de Emergências da OMS/WPRO, declarou: “A forma como produzimos, processamos, comercializamos, preparamos e consumimos alimentos tornou-se insustentável. […] A possibilidade de produzir carne alternativa sem o abate de animais traz um benefício óbvio: reduzir impactos ambientais e problemas de saúde relacionados com o surgimento de novas doenças na interface animal-humano-ambiente. […]”.

Finalizando os trabalhos, a Dra. Simone Moraes Raszl, oficial técnica da Divisão de Segurança de Alimentos, Sanitária e de Emergências do Escritório Regional da OMS para o Pacífico Ocidental, afirmou que as proteínas alternativas fazem parte da transformação por um sistema alimentar mais sustentável. “As proteínas alternativas podem ser um divisor de águas nesse processo e precisamos garantir que sejam seguras. Não há risco zero quando falamos em alimentos e precisamos ser capazes de nos basear na ciência e em evidências para abordar a segurança de proteínas alternativas e regulamentá-las adequadamente”.

Quanto vale a floresta?

Há 29 anos, as Nações Unidas comemoram o dia 22 de maio como o Dia Internacional da Biodiversidade. A data visa aumentar a compreensão e a conscientização sobre a importância da diversidade biológica, além da necessidade de proteção da biodiversidade em todos os ecossistemas. Com o mote “Somos parte da solução”, a data defende a ideia de que a biodiversidade é a resposta para vários desafios do desenvolvimento sustentável.

No Brasil, uma nova espécie da fauna e flora é descoberta ou descrita a cada três dias. Dados levantados pela Associação Brasileira de Bioeconomia (ABBI) confirmam o potencial do país em ser um dos maiores players do setor, considerando o fato da nação concentrar mais de 100 mil espécies animais e cerca de 45 mil de vegetais com mais de 500 milhões de hectares, 340 milhões ainda intactos, representando 20% da biodiversidade global. Motivados pelo potencial e capacidade do Brasil que é berço de uma rica diversidade, o The Good Food Institute realizou um mapeamento dos biomas da Amazônia e Cerrado para identificar produtos do extrativismo vegetal com maior potencial técnico e econômico a serem estudados em mais profundidade para transformá-los em ingredientes para a indústria de proteínas vegetais.

“A biodiversidade brasileira é, ainda, pouco conhecida, negligenciada e subutilizada. Na medida em que não a valorizamos, estamos contribuindo, indiretamente, para a sua perda.”, afirma Katherine de Matos, diretora de Ciência e Tecnologia do GFI Brasil. Em primeira análise, o GFI identificou 20 produtos nativos do extrativismo vegetal na Amazônia e 13 no Cerrado. Destes, a instituição selecionou três produtos de cada bioma para uma pesquisa e estudo mais aprofundados. No Cerrado, os produtos foram a macaúba, o baru e o pequi. Na Amazônia, a castanha-do-brasil, o babaçu e o cupuaçu. 

Para chegar aos resultados econômicos, o GFI considerou o número de comunidades produtoras, volume de produção e maturidade da cadeia produtiva. Para a análise de potencial técnico, foram utilizados critérios como a composição química dos produtos nativos, o potencial tecnológico e aspectos nutricionais. 

“A potencialidade da flora nativa brasileira não está refletida nos supermercados, nas feiras e muito menos na cozinha do brasileiro. Como resultado, a sociedade deixa de aproveitar os benefícios decorrentes dessa riqueza. No caso das espécies de uso alimentício, por exemplo, a sociedade acaba não se beneficiando dos elevados valores nutricionais presentes nas espécies nativas. A natureza é rica, entretanto, essa riqueza precisa e deve ser usada com sabedoria. Essa pode ser a grande saída da humanidade para o futuro”, explica Cristiana Ambiel, gerente de Ciência e Tecnologia do GFI Brasil.

Para se ter uma ideia, estudos realizados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) mostram que a bioeconomia, modelo econômico e industrial que utiliza matérias-primas regenerativas da biodiversidade em substituição aos recursos fósseis e não renováveis, movimenta cerca de 2 trilhões de euros e gera 22 milhões de empregos no mundo todo. Até 2030, as expectativas são de que as biotecnologias representarão 80% da produção de fármacos, 50% da produção agrícola e 35% dos produtos químicos. Conheça um pouco mais sobre os ingredientes selecionados pelo GFI e suas propriedades: 

Com significativa produção nacional de cerca de 32.900 toneladas no ano de 2019 segundo o IBGE, a castanha-do-brasil in natura constitui uma favorável fonte proteica (15,60%) e lipídica (61,00%). O seu óleo possui uma boa qualidade nutricional (85% de ácidos graxos insaturados) e apresenta índices de acidez e peróxidos que atendem a legislação brasileira para óleos vegetais comestíveis.

A produção nacional de Babaçu atingiu cerca de 48.700 toneladas no ano de 2019 segundo o IBGE, envolvendo cerca de 37 comunidades produtoras segundo a Conexsus. A amêndoa do babaçu possui 7,25 % de proteína e 66% de lipídeos. O seu óleo apresenta características funcionais interessantes por ser constituído de 83% de ácidos graxos saturados. Este produto, destinado à alimentação humana como suplemento alimentar, e, na medicina popular no tratamento de inflamações, já é produzido e comercializado por algumas comunidades. 

Com uma produção de cerca de 787 toneladas no ano de 2017, segundo o IBGE, a polpa do cupuaçu é destinada à produção de diversos alimentos (polpa congelada, sorvete, geleias, etc). Dessa produção, gera-se como resíduo as sementes. A semente do cupuaçu possui 9,4% de proteína e 64,9% de lipídeos. Do óleo extraído dessa semente forma-se uma torta com altos teores de proteína (15,2%), fibras (47,6%) e lipídeos (21,0%). A torta de cupuaçu se mostra como uma alternativa para a elaboração de isolados proteicos devido a sua riqueza de aminoácidos essenciais, tornando-se uma fonte de proteína alternativa.

Segundo dados do IBGE, a produção nacional de Macaúba atingiu cerca de 1.178 toneladas no ano de 2018. A polpa e amêndoa de macaúba podem ser industrialmente exploradas não só como fonte de óleos vegetais, mas também como fonte de proteínas e carboidratos. Estas propriedades são desejáveis para a formulação de diferentes tipos de alimentos, com destaque para a indústria de panificação e massas e a indústria de produtos cárneos, além da importância na fabricação de suplementos alimentares.

A produção nacional de Baru atingiu cerca de 69,3 toneladas no ano de 2019, segundo o IBGE. A polpa do baru possui 6,0% de proteína; 41,6% de fibras; 3,4% de lipídeos e 22,5% de carboidratos, sendo comercializada, usualmente, na forma de farinha. A amêndoa possui cerca de 30% de proteína; 15% de fibras e 40% de lipídeos, sendo comercializada na forma de amêndoa torrada. O óleo da amêndoa de baru tem elevado grau de insaturação, sendo similar ao óleo de oliva e, portanto, com potencial para ser usado como óleo de cozinha. 

O Pequi tem produção nacional de cerca de 27.183 toneladas no ano de 2019. A polpa do pequi possui 3,7% de proteína; 15% de fibras e 33,4% de lipídeos. O óleo extraído da polpa se constitui de 62% de ácidos graxos insaturados. A polpa é comercializada na forma in natura, congelada e em conserva. Apesar de considerada uma proteína de baixa qualidade, é comparável à proteína da farinha de trigo, e pode ser adicionada de misturas para melhorar sua qualidade.

O GFI Brasil incentiva o investimento em pesquisa e desenvolvimento da biodiversidade para encontrar inovações tecnológicas que supram as demandas da indústria de forma sustentável. Dessa forma, promovemos a conservação da floresta em pé, proporcionamos o desenvolvimento de novas cadeias produtivas e a melhoria da qualidade de vida das comunidades locais.

GFI Brasil abre processo seletivo para especialista em carne cultivada

Como uma organização sem fins lucrativos, o The Good Food Institute se dedica ao avanço da pesquisa de acesso aberto em proteínas alternativas e à criação de um ecossistema voltado para o desenvolvimento científico e acadêmico desse setor. Já existem muitas alternativas baseadas em plantas, e uma série de iniciativas para produção de carnes cultivadas, mas no Brasil, temos o grande desafio de estruturar e consolidar a ciência e a tecnologia do cultivo celular para que o país continue sendo um grande player na produção de proteínas no mercado mundial.

Por isso, o GFI Brasil acaba de abrir um processo seletivo para especialista em carne cultivada. Como especialista neste setor, o ou a profissional trabalhará para garantir que o plano de desenvolvimento para carne cultivada no Brasil seja exequível; que os melhores cientistas estejam engajados em P&D de carne cultivada; e que fundos significativos sejam direcionados para empreendimentos científicos para criar e consolidar a indústria de carne celular e outros produtos da agricultura celular no país sem depender de tecnologia externa.

Para se inscrever, basta ler o edital e preencher este formulário com seus dados pessoais, CV e plano de projeto em Carne Cultivada.

Fique de olho nos prazos!

Queremos as melhores pessoas e não queremos preconceitos nos impedindo. Nós encorajamos pessoas de todas as cores, orientações, idades, gêneros, origens e habilidades para se inscreverem. Como valorizamos um local de trabalho diversificado, promovemos um clima inclusivo, sem discriminação e assédio durante o processo de inscrição e depois que você se juntar à equipe. Contamos com uma rotina saudável de trabalho com liderança respeitosa e com apoio entre os colegas. Trabalhamos de forma autônoma e em uma organização em rápido crescimento, mudança e evolução. 

Boa sorte!

Pela primeira vez, Brasil aprova emenda parlamentar para financiar projeto de pesquisa em proteínas alternativas

O The Good Food Institute Brasil celebra feito inédito e promissor: a Câmara dos Deputados aprovou a primeira emenda parlamentar que financiará com R$530.000,00 uma pesquisa do setor de proteínas alternativas. O projeto de pesquisa aprovado foi da professora Dra. Ana Lúcia Vendramini, profissional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que estuda o cultivo e aproveitamento econômico de algas marinhas cultivadas na região de Paraty (RJ). Os responsáveis por esse acontecimento inédito foram o deputado Paulo Ganime (NOVO-RJ), que se tornou o primeiro parlamentar brasileiro a direcionar recursos públicos a um projeto deste segmento, e o GFI Brasil que incentiva e fomenta o apoio às pesquisas científicas e tecnológicas em proteínas alternativas.

A pesquisa em questão vai examinar o aproveitamento da espécie de alga Kappaphycus alvarezii como potencial ingrediente para produtos de origem vegetal. “A inicialização do projeto será possível graças ao fundamental apoio de uma das mais importantes universidades do país, a UFRJ, somada aos nossos parceiros da Costa Verde. O projeto é audacioso por atender as autênticas demandas de sustentabilidade, visando um comércio justo, bem-estar social, o desenvolvimento de produtos inovadores e a abertura de novos mercados.

Com o financiamento de mais de meio milhão de reais será possível concluir a primeira fase do projeto com a instalação da fazenda marinha e a capacitação de pessoal. Esta fazenda servirá como banco de mudas para os novos algicultores, o fornecimento de algas frescas para as pesquisas e o desenvolvimento de novos produtos”, explica a Dra. Ana Lúcia Vendramini. 

A pesquisa é visionária e pode contribuir para o desenvolvimento econômico e social, possibilitando inclusive alavancar uma cadeia de produção na região. “A emenda em questão foi selecionada pelo alinhamento com alguns temas que defendo, como Bioeconomia e inovação, além de ter potencial para novas oportunidades de emprego e renda na região da Costa Verde do Rio de Janeiro. Espero que, ao final do período de financiamento, o projeto se torne autossustentável e consolide a indústria na região. Vislumbro formar outras parcerias, inclusive apresentando o projeto ao Governo do Estado e às prefeituras da região da Costa Verde, para construirmos uma infraestrutura em paralelo que garanta capacitação, estradas em bom estado e acesso a ferramentas de produção”, complementa o deputado Ganime. 

O GFI dedica-se ao avanço da pesquisa de acesso aberto em proteínas alternativas e à criação de um ecossistema voltado para o desenvolvimento científico e acadêmico desse setor. Além de promover um Programa Anual de Incentivo à Pesquisa que já financiou mais de USD 7 milhões em recursos para estudos sobre carne cultivada, proteínas vegetais e obtidas por processos de fermentação, a instituição aproxima pesquisadoras de potenciais empresas, pessoas e instituições interessados em subsidiar os projetos.

Para Alexandre Cabral, diretor de políticas públicas do GFI Brasil, as proteínas alternativas são fundamentais para a redução do aquecimento global prevista no Acordo de Paris e a necessidade urgente de alimentar 10 bilhões de pessoas até 2050. “Apoiar o desenvolvimento deste mercado permite que o Brasil seja protagonista em um sistema global de alimentação mais sustentável. Vendendo produtos de maior valor agregado, você passa de celeiro do mundo para supermercado do mundo, aproveitando os já consolidados canais de armazenamento e exportação de produtos de origem animal”.

Paulo Ganime concorda com essa posição, e, para ele, a inovação tecnológica é a base para encontrar soluções e a Biotecnologia é uma das chaves para o desenvolvimento econômico em coexistência harmoniosa com o meio ambiente. “Acredito que iniciativas como esta podem contribuir para apresentar alternativas à sociedade em termos de alimentação e proporcionar o melhor uso da nossa biodiversidade. Essas alternativas agregam valor à Bioeconomia e promovem a liberdade do indivíduo”.  

2020 teve investimento recorde de US$ 3,1 bilhões em proteínas alternativas, mas Brasil ainda tem espaço para crescer

Novos dados divulgados pelo The Good Food Institute (GFI) revelam que, mundialmente, 2020 foi um período recorde de investimentos em empresas que produzem alternativas sustentáveis aos alimentos de origem animal, incluindo empresas de carne, ovo, leite e derivados à base de vegetais; carne cultivada; e fermentação de proteínas alternativas. Esse aumento de investimentos demonstra que o mercado aposta no crescimento do setor de proteínas alternativas, mesmo com os desafios impostos pela pandemia, como diminuição da renda familiar e a falência de restaurantes, por exemplo. Por outro lado, o aumento sinaliza um interesse crescente por investimentos em sustentabilidade e inovação tecnológica.

O GFI analisou a atividade de investimento nessas indústrias utilizando a plataforma PitchBook Data e mostrou que as empresas globais de proteínas alternativas receberam US $3,1 bilhões em investimentos divulgados em 2020. Esse valor é mais de três vezes maior do que o USD $1 bilhão levantado em 2019 e quatro vezes e meia maior do que os USD $694 milhões levantados em 2018. As empresas de proteínas alternativas levantaram quase US$ 6 bilhões em capital investido na última década (2010-2020), sendo mais da metade apenas em 2020:

A confiança dos investidores nas empresas de proteínas alternativas é impulsionada por vários fatores de mercado, mas as questões sociais, ambientais e econômicas expostas em 2020 iluminaram ainda mais os riscos associados às práticas de negócios tradicionais. Com mais investidores reconhecendo que risco climático é risco de investimento, as proteínas alternativas oferecem uma solução escalável que deixa o mundo mais próximo de um sistema alimentar mais seguro e neutro em carbono.

Realidade Brasileira

As únicas empresas brasileiras com dados disponíveis no PitchBook são Fazenda Futuro e The New Butchers. Portanto, não há como considerar apenas este estudo para avaliar a realidade de investimentos no país. Apesar disso, de acordo com Raquel Casselli, gerente de Engajamento Corporativo do GFI Brasil, “o cenário também é promissor por aqui, apesar das incertezas de mercado decorrentes da pandemia. Tivemos bons investimentos no setor, embora a maioria das transações não tenham se tornado públicas e, portanto, não estão representadas fielmente nos números globais.”, afirma.

Bruno Franco, sócio da investidora Enfini Ventures, concorda. Para ele, o Brasil tem potencial para se tornar um forte produtor e exportador de proteínas alternativas. “Nós já somos o maior exportador de proteína animal do planeta, com amplo conhecimento em processos produtivos. Temos um bom capital intelectual nacional, dentro de universidades e empresas, focado em desenvolver pesquisas na área que abrange desde desenvolvimento agrícola e de ingredientes até produtos finais ao consumidor. No setor plant-based isso é mais visível e dinâmico.”, argumenta

Com relação ao segmento de carnes cultivadas, Bruno acredita que o país vai centrar esforços no desenvolvimento de parcerias com empresas que sejam casos de sucesso no exterior, a fim de trazer a tecnologia para o Brasil para ser usada no desenvolvimento de produtos locais. “Já vemos grandes players do mercado fazerem parcerias com desenvolvedores de tecnologia e produtos. As empresas estão, de certa forma, alavancando a estrutura já existente e todo o know-how da cadeia logística para trazerem soluções tecnológicas inovadoras.”.

Desafios para atrair investimentos

De acordo com Bruno Franco, o maior desafio para startups brasileiras no setor é ter uma estrutura de pesquisa e desenvolvimento que forneça suporte para o desenvolvimento de projetos. “Os laboratórios e ambientes de pesquisa são poucos em número e pouco acessíveis. No Brasil, os negócios que têm dado mais certo são os que partem de empreendedores com uma base de recursos próprios e/ou rede de relacionamento que suportam um início mais robusto da tese. Apesar dessas iniciativas serem muito bem-vindas, a proliferação de startups no setor dependerá de apoio institucional e empresarial mais enraizado.”, afirma.

Além disso, as startups e foodtechs precisam convencer os investidores de que possuem bons projetos, planos de negócios claros, e que estão preparadas para receber recursos. “Os investidores que entram nesse mercado buscam empreendedores com histórias de sucesso, times preparados e alinhados no sucesso do negócio e teses claras. Os tomadores de decisão a cargo de investimentos hoje (sejam family offices, empresas ou fundos) possuem critérios de análise muito elevados e gostariam que um número maior de startups tivesse condição de atender a tais critérios.”, conclui.