A Ciência das Proteínas Cultivadas

A pesquisa em relação acerca da produção de carne cultivada vem crescendo aceleradamente nos últimos seis anos. Diversos grupos ao redor do mundo vêm pesquisando condições de cultivo mais apropriadas e eficientes para produção em escala industrial, que permitam um processo seguro, menos custoso e mais rentável. Apesar da tecnologia estar mais desenvolvida para cultura de células animais, para produção de carne de bovino, suíno e frango, pescados e frutos do mar, processos similares têm sido desenvolvidos para produção de leite, colágeno e ovos. 

 

Uma cadeia produtiva inteira está se formando ao redor do tema, desde fornecedores de linhagens celulares, meios de cultura e design de bioprocessos até a fabricação de biorreatores, otimização de processos biotecnológicos, biomateriais para suportes (scaffolds) e tecnologias para downstreaming do processo de produção de carne cultivada. O interesse é crescente, e tem se dedicado muita pesquisa e investimento ao desenvolvimento dessa tecnologia. Paralelamente, órgãos reguladores e o setor produtivo já buscam estruturar o marco regulatório para garantir a segurança do produto e viabilizar sua comercialização. 

 

Estudos anteriores demonstram que o setor da agropecuária representa 30% da ocupação da superfície terrestre e 70% das terras agrícolas (Bhat, Morton, Mason, Bekhit, & Bhat, 2019). Ainda assim, a demanda de consumo de carne tende a dobrar até 2050, fazendo com que a produção da carne na forma tradicional não seja sustentável (Henchion, Hayes, Mullen, Fenelon, & Tiwari, 2017). Em relação às questões de sustentabilidade durante a produção de carne, é preciso considerar não só a emissão de CO2 pela fermentação entérica durante a criação dos animais, mas também as atividades relacionadas à produção de ração, como o uso de fertilizantes e pesticidas, uso de terra e consumo de água pela agricultura, além dos produtos veterinários para tratamento dos animais.  

 

A produção de carne utilizando animais é considerada ineficiente, uma vez que esses seres consomem grande quantidade de alimentos, sendo a maior parte da energia gasta com o seu próprio metabolismo e na produção de tecidos não comestíveis (como ossos, tendões e couro). Em contrapartida, a estrutura da carne cultivada não contém miudezas ou componentes não comestíveis, o que não apenas reduz o tempo de produção, mas também diminui a quantidade de nutrientes necessária por quilograma de Carne. 

 

Em termos de consumo de água e emissão de gases de efeito estufa, o cultivo de carne tem potencial para ser mais eficiente que a carne convencional (Bhat et al., 2019). Ainda, acredita-se que o uso de células cultivadas permitiria o controle no uso de antibióticos na produção, reduzindo seu consumo, bem como os problemas relacionados à resistência antimicrobiana pelo seu uso na agropecuária. 

 

A produção de carne cultivada também está embasada em aspectos éticos em relação ao uso de animais para a alimentação humana. Considera-se que a indústria da carne em geral (gado, aves ou suínos) apresenta condições críticas de criação, como superconfinamento e maus tratos. Ainda, inevitavelmente, exige o abate animal para obtenção do produto final. 

 

O risco de disseminação de doenças infecciosas por microrganismos, como os do gênero Salmonella e Listeria, também é minimizado na produção de carne cultivada, uma vez que permite maior controle das condições assépticas da produção. A carne produzida pode passar por um rigoroso controle de qualidade, possibilitando que se tenha um produto final livre de infecções, doenças, parasitas ou mesmo contaminantes químicos. Além disso, com maior controle sobre os ingredientes adicionados, tipo de células e sua diferenciação sob esse sistema, a composição do produto desenvolvido poderá vir a ser adaptada de acordo com as demandas dos consumidores.  

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