Novas fontes e sistemas de produção de alimentos: principais resultados do relatório FAO 2023

A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) divulgou recentemente o relatório da Reunião Técnica de Prospectiva de Segurança de Alimentos sobre Novas Fontes e Sistemas de Produção de Alimentos de 2023, que aconteceu em novembro do mesmo ano. Este encontro contou com a presença de especialistas globais, incluindo Graziele Karatay, Especialista de Ciência e Tecnologia do GFI Brasil, para discutir os desafios e oportunidades relacionados à segurança dos alimentos plant-based, e das tecnologias de fermentação de precisão e impressão 3D de alimentos. O documento sintetiza a literatura existente nessas novas fontes e sistemas de produção de alimentos, abordando tanto os riscos à segurança de alimentos, quanto outros aspectos relevantes, como características nutricionais, impactos ambientais e percepção dos consumidores. 1. Questões de Segurança de Alimentos Esse tópico emergiu como um dos principais pontos de discussão no desenvolvimento de novos alimentos e sistemas de produção e os principais pontos destacados no relatório nas três áreas são: Plant-based Os perigos de segurança de alimentos são semelhantes aos dos alimentos convencionais. Os consumidores podem erroneamente considerar os produtos não cozidos como seguros. Uma gestão adequada da segurança de alimentos pode reduzir significativamente os riscos, como microrganismos patogênicos e de deterioração, e contaminantes químicos. Fermentação de precisão As etapas de produção são geralmente bem conhecidas e controladas. Perigos potenciais: crescimento de microrganismos patogênicos, contaminantes químicos, alergenicidade. A seleção rigorosa de cepas, o monitoramento adequado e o cumprimento das diretrizes de segurança de alimentos podem reduzir os riscos. Impressão 3D de alimentos Fatores-chave para prevenir o crescimento microbiano: Parâmetros para impressão, processamento, armazenamento e condições de formulação dos ingredientes de entrada. O projeto higiênico do equipamento é crítico para evitar a lixiviação (processo pelo qual substâncias indesejadas, como contaminantes, são transferidas do equipamento, no caso a impressora, para o alimento). 2. Características Nutricionais Plant-based Possíveis benefícios para a saúde: melhoria nos marcadores cardiometabólicos e na saúde intestinal. Possíveis deficiências nutricionais: vitamina B12 e certos aminoácidos (como metionina e cisteína, no caso de alimentos à base de leguminosas). Fermentação de precisão Pode alterar as propriedades dos produtos nativos (por exemplo, reduzir a alergenicidade e aumentar a biodisponibilidade) ou produzir novos produtos. Impressão 3D de alimentos A dosagem precisa de vários ingredientes ou nutrientes pode ajudar a atender às necessidades nutricionais individuais. 3. Aspectos Ambientais Plant-based Alimentos à base de plantas podem ter uma pegada ambiental menor do que os alimentos de origem animal, mas comparações diretas são complexas. Fermentação de precisão Menor impacto ambiental em comparação com laticínios convencionais (por exemplo, emissões de metano e agroquímicos). A produção de alimentos em ambientes fechados e controlados não é afetada pelas condições climáticas. Alto consumo de eletricidade. Impressão 3D de alimentos Os aspectos de sustentabilidade ambiental da impressão 3D de alimentos permanecem inexplorados. 4. Percepção do Consumidor Plant-based Interesse do consumidor em experimentar alimentos à base de plantas. Percepção de serem “altamente processados”. Reduzir os custos e aumentar a diversidade de produtos melhorará a adoção pelos consumidores. Fermentação de precisão Disposição do consumidor para experimentar produtos com ingredientes feitos por fermentação de precisão. Segurança, nutrição, sabor e impactos ambientais são fundamentais para a aceitação do consumidor. Impressão 3D de alimentos As percepções dos consumidores são influenciadas pela falta de conhecimento sobre alimentos impressos em 3D e pela terminologia técnica (por exemplo, vistos como “não naturais” e “sintéticos”). Conclusão O relatório da FAO oferece uma visão abrangente dos avanços e desafios na produção de alimentos plant-based, obtidos por fermentação de precisão e impressão 3D, reafirmando a importância de regulamentações robustas, desenvolvimento contínuo e uma comunicação clara com o consumidor. O GFI Brasil segue acompanhando esses avanços para garantir que essas inovações possam ser amplamente implementadas, com segurança e benefícios claros tanto para o meio ambiente quanto para a saúde pública. Acesse o relatório completo aqui. A FAO também produziu uma série de 4 vídeos a partir de entrevistas feitas com os especialistas durante a reunião técnica. Confira a playlist no Youtube. https://www.youtube.com/watch?v=1N7KhFl5bD8&list=PLzp5NgJ2-dK7OoCcSAP-tyVzmuiCsEo8G&index=5
Estudo inédito avalia aspectos de segurança na produção de carne cultivada

Conduzido pelo GFI Brasil e pela Unicamp, o documento identifica perigos e propõe medidas de controle para garantir a produção segura de carne cultivada. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), em torno de 420 mil pessoas morrem todos os anos em decorrência da ingestão de alimentos contaminados. A fim de inspirar ações globais que ajudem a prevenir, detectar e gerenciar riscos de origem alimentar, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) instituiu o Dia Mundial da Segurança de Alimentos, celebrado em 7 de Junho. Para contribuir com a campanha deste ano, cujo tema é “Padrões alimentares salvam vidas”, o The Good Food Institute Brasil (GFI Brasil) e a Universidade Pública de Campinas (Unicamp), lançam um estudo inédito que mapeia perigos e apresenta medidas de controle para garantir a segurança da carne cultivada, alimento que deve chegar ao mercado brasileiro em 2024. Motivado a partir de discussões com a Anvisa e o Ministério da Agricultura (MAPA) durante um workshop realizado pelo GFI Brasil em 2021, o objetivo foi desenvolver um Plano APPCC (Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle) para um produto-alvo de carne cultivada. Entenda como o estudo foi conduzido O estudo optou por modelar o processo de produção completo e em escala piloto de um hambúrguer de carne cultivada. Os 10 cientistas envolvidos avaliaram os perigos potenciais em todas as fases do processo, desde a escolha do animal doador até o processamento final. Amanda Leitolis, Especialista Sênior de Ciência e Tecnologia do GFI Brasil e uma das cientistas responsáveis pelo estudo, explica que muitos dos perigos identificados, como resíduos de drogas veterinárias e auxiliares de processamento que possam permanecer no produto final, microorganismos oriundos dos animais doadores ou de falhas de manipulação durante o processo, já são antigos conhecidos da indústria de alimentos convencionas. “Isso pode nos indicar que as ferramentas e os sistemas de gestão normalmente empregados na indústria de alimentos, como é o caso do APPCC, também são úteis para garantir a segurança de alimentos feitos por cultivo celular”, afirma Amanda. O estudo também apontou algumas lacunas de conhecimento que ainda precisam ser aprofundadas, como a determinação dos fatores que influenciam o prazo de validade dos produtos cultivados e as potenciais diferenças nos eventos bioquímicos que acontecem nas células da carne cultivada após a coleta. “Com esse trabalho, nós conseguimos antecipar gargalos para acelerar o desenvolvimento e a comercialização de carne cultivada. Criamos uma primeira estrutura que agora poderá contribuir para que outros profissionais da indústria possam desenvolver seus próprios planos e fazerem toda a gestão de segurança. Nossa intenção é conhecer os perigos antes para que tudo seja feito de forma segura desde o início. É uma iniciativa que certamente contribui com o desenvolvimento da própria indústria como um todo”, completa Amanda. Bibiana Matte, pesquisadora especializada em engenharia de tecidos e co-fundadora da Cellva Ingredients, explica que, inicialmente, o desafio do estudo foi combinar competências da agricultura celular, como biotecnologia, engenharia de tecidos, bioprocessos e alimentos, para desenvolver o processo e o produto. “Buscamos trabalhar em equipes interdisciplinares que trazem diferentes vivências e, através dessa combinação, desenvolvemos tecnologias pioneiras no Brasil como o primeiro hambúrguer de carne cultivada bovina e, mais recentemente, as primeiras degustações de alimentos com gordura cultivada suína na Cellva. Quando a carne cultivada estará no prato do brasileiro? Por enquanto, Singapura permanece como o único país onde produtos de carne cultivada já são comercializados. No entanto, a Food and Drug Administration (FDA), equivalente à Anvisa dos Estados Unidos, fez consultas pré-comercialização de produtos feitos a partir de cultivo celular das empresas UPSIDE Foods e a GOOD Meat, e os considerou seguros para consumo humano. No Brasil, além da Cellva, JBS, BRF e Sustineri Piscis são outras marcas que estão desenvolvendo carne cultivada, com lançamentos previstos para 2024 e 2025. “Em relação ao futuro, entendo que o Brasil tem um papel essencial na produção e exportação de alimentos para o mundo e que, para a agricultura celular acontecer, o país também precisará ter relevância como parte dessa cadeia de fornecedores. Acreditamos que a nossa biodiversidade e relevância alimentar propiciam o desenvolvimento dessa tecnologia. A agricultura celular democratiza a produção da cadeia de suprimentos de alimentos, uma vez que substitui o abate animal, utiliza menos recursos naturais e produz em menor tempo. Da mesma forma, preserva o sabor e textura dos alimentos que conhecemos e pode trazer benefícios nutricionais”, completa Bibiana. Gordura de porco cultivada da Cellva
7 de junho: Dia Mundial da Segurança de Alimentos

A alimentação segura é essencial para promover a saúde humana e erradicar a fome. GFI quer garantir a segurança de produtos à base de plantas. O Dia Mundial da Segurança dos Alimentos foi criado pela ONU em 2018 e é celebrado todo 7 de junho. O principal objetivo da data é chamar a atenção para a importância de todos os seres humanos terem acesso a alimentos seguros, além de fortalecer esforços para prevenir, detectar e gerenciar perigos de origem alimentar. O acesso a quantidades suficientes de alimentos seguros e nutritivos é fundamental para sustentar a vida e promover a boa saúde. Apesar de ser um direito, o acesso à alimentação adequada ainda não é a realidade de muitas pessoas no planeta. Por isso, o tema da campanha de 2022 é “Alimentação Segura, Melhor Saúde”. Segurança alimentar e segurança dos alimentos são dois conceitos que vêm ganhando destaque no debate público, especialmente no contexto da pandemia da COVID-19. Os termos são parecidos e estão correlacionados, mas têm significados diferentes: segurança alimentar é a garantia que todas as pessoas tenham acesso aos alimentos, com fornecimento estável, abastecimento assegurado e distribuição equitativa. Já a segurança de alimentos trata de garantir que os alimentos consumidos pelas pessoas sejam seguros e livres de contaminação, ou seja, não causem nenhum efeito adverso à saúde dos consumidores, quando consumidos de acordo com o seu uso pretendido. Não existe segurança alimentar sem segurança dos alimentos e, como cita o novo guia da FAO/OMS para o Dia Mundial da Segurança dos Alimentos, “se não for seguro, não é alimento”. Segundo a FAO, quase uma em cada três pessoas no mundo, ou 2,37 bilhões de pessoas, não teve acesso à alimentação adequada em 2020 – um aumento de quase 320 milhões de pessoas em relação ao ano de 2019. O trabalho do GFI pela segurança dos alimentos Os setores de alimentos feitos de planta (plant-based) e carne cultivada estão presentes em muitos dos drivers e tendências analisados pelo estudo da FAO “Pensando no futuro da segurança de alimentos – um relatório prospectivo”. Além dessas alternativas mais “populares”, a produção de algas marinhas e macroalgas e a produção de micoproteínas (derivadas de fungos filamentosos) também são citados pelo relatório como segmentos em expansão. A indústria de alimentos à base de plantas pode não só ajudar na transição para um sistema alimentar global mais sustentável, saudável, ético e justo, mas também pode ajudar a evitar que crises relativas à segurança dos alimentos continuem surgindo. Isso porque produtos de origem animal (como ovos, peixes, frutos do mar, carne crua, leite e derivados), quando mal manuseados, se tornam fontes de transmissão de DTAS, e a adoção de uma dieta baseada em plantas poderia minimizar essas contaminações. Além disso, o consumo de proteínas alternativas vai continuar crescendo e, como indica relatório do GFI (que prevê os requisitos globais de volumes de produção relativos à colheita, ingredientes, infraestrutura e investimentos para o setor em 2030), a indústria vai precisar se preparar e se adaptar para suprir a demanda. Pensando nisso, o The Good Food Institute Brasil está trabalhando diretamente em duas iniciativas para contribuir com a segurança de alimentos das proteínas alternativas. A primeira iniciativa trata-se de um estudo de segurança de alimentos aplicado para carne cultivada. Este estudo, iniciado recentemente, está sendo realizado na UNICAMP por uma equipe multidisciplinar de pesquisadores e sob a coordenação do professor Dr. Anderson S. Sant’Ana. O objetivo final do estudo é estabelecer um plano de segurança de alimentos que aborde os aspectos de qualidade e segurança da produção de carne cultivada usando como base as recomendações do Codex Alimentarius. Além desta iniciativa, em maio o GFI lançou umaa chamada para o desenvolvimento de um outro estudo sobre segurança de alimentos, porém voltado para produtos plant-based. Por isso,convidamos pesquisadores, empresas e instituições interessadas a enviarem suas propostas até o dia 9 de junho. Estes dois trabalhos, , que terão duração de 4 e 5 meses, vão contribuir para geração de subsídios técnicos e científicos para orientar as futuras ações de legisladores, pesquisadores, professores, produtores e empresários do segmento. Em comparação aos produtos de carne convencional, as alternativas à base de plantas geralmente são compostas por uma diversidade maior de ingredientes – as proteínas vegetais, por exemplo, variam entre leguminosas, pulses, sementes, cereais e tubérculos, e as gorduras costumam vir de um combinação entre óleos (como de canola, coco, soja e girassol), manteiga de cacau, etc. A diversidade de ingredientes nos produtos plant-based é uma vantagem, porque possibilita o ajuste da composição para alcançar as necessidades tecnológicas, funcionais e sensoriais desejadas, mas também pode gerar um ponto de atenção, porque aumenta o número de fontes de onde perigos podem surgir. Além disso, apesar da indústria de alternativas à base de plantas ter nascido fortemente associada à de produtos animais, as considerações de segurança entre elas são bem diferentes. O desafio de hoje é identificar todos os potenciais riscos para superá-los e quanto mais informações científicas, melhor. Por isso, o GFI vem trabalhando em parceria com o governo, municiando as equipes técnicas do Mapa e da Anvisa com dados essenciais para o processo regulatório dos produtos plant-based no Brasil. O que mais precisamos saber sobre Segurança de Aimentos? Incidentes locais, efeitos globais Além de essencial para a saúde humana, a produção de alimentos seguros também reduz o desperdício, preserva recursos, beneficia a economia, cria mercados nacionais prósperos, exportações estáveis e reduz a pressão sobre os sistemas de saúde. A segurança dos alimentos é afetada pela saúde dos animais, das plantas e do ambiente em que eles são produzidos; por isso, o problema deve ser tratado de forma holística, onde o planeta é visto como um sistema único e complexo. Hoje, qualquer incidente na cadeia de suprimento de alimentos pode desencadear efeitos negativos não só regionais, mas globais. De acordo com a ONU, embora o vírus da COVID-19 não seja transmitido por alimentos, a pandemia colocou em destaque muitas questões relacionadas a eles, como higiene, resistência antimicrobiana, doenças zoonóticas, mudanças climáticas e
GFI Brasil lança chamada para estudo sobre segurança de alimentos plant-based

Projeto inicia em setembro de 2022 e tem prazo de 5 meses por Victoria Gadelha O The Good Food Institute Brasil convida pesquisadores, empresas e instituições interessadas em desenvolver o Estudo dos Aspectos de Segurança de Alimentos Aplicados na Produção de Produtos Cárneos Feitos de Plantas a enviarem suas propostas até dia 9 de junho. O objetivo do estudo é estabelecer um plano que contemple os aspectos de segurança de alimentos para produção de produtos cárneos feitos de plantas, usando como base a ferramenta de “Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle” (APPCC). Devem ser abordados pelo menos quatro produtos feitos de plantas e devem ser considerados os principais pontos da cadeia de produção que precisam ser controlados para obter produtos seguros, assim como os pontos que requerem aprofundamento científico para identificação e controle dos perigos. Dessa forma, o documento visa prover subsídios técnicos e científicos para embasar e orientar as futuras ações de legisladores, pesquisadores, professores, produtores rurais e empresários desse segmento. O estudo será dividido em quatro etapas (estruturação da equipe multidisciplinar, treinamento da mesma, desenvolvimento do estudo e elaboração do relatório final) e o GFI Brasil, além de validar essas etapas, vai também acompanhar o processo por meio de relatórios e reuniões de acompanhamento. O projeto é previsto para iniciar em setembro de 2022 e o prazo desejado para a execução do estudo é de cinco meses. As propostas poderão ser enviadas até dia 9 de junho, em formato PDF, para o email ciencia@gfi.org. A proposta deve conter obrigatoriamente um cronograma, os valores previstos para a execução de cada etapa, o investimento total, a metodologia a ser utilizada e o currículo dos profissionais que irão desenvolver o trabalho. As orientações completas para submissão, assim como todas as demais informações sobre o estudo, podem ser acessadas neste link. Contextualização Os produtos feitos de plantas costumam apresentar uma maior diversidade de ingredientes do que os produtos de carne convencional. Essa é, ao mesmo tempo, uma grande vantagem e uma desvantagem, porque apesar da possibilidade de usar vários ingredientes para ajustar a composição do produto e alcançar as necessidades tecnológicas, nutricionais, funcionais e sensoriais, um maior número de ingredientes também significa um maior número de fontes de onde perigos podem potencialmente surgir. Apesar da indústria de produtos cárneos feitos de plantas ter nascido fortemente associada à indústria de produtos animais, as considerações de segurança para produtos plant-based são diferentes das necessárias para produzir produtos de origem animal: a segurança dos alimentos à base de plantas depende do solo, dos insumos agrícolas usados onde as plantas de origem são cultivadas, de como as plantas são colhidas, armazenadas, transportadas, processadas para obter os isolados de proteína e manuseadas pós-processamento. O consumo de carne vegetal vai continuar crescendo nos próximos anos e a indústria precisa se preparar para atender à demanda. O Brasil tem grande potencial para se tornar referência mundial em proteínas alternativas: nossa capacidade, força e “know-how” de produção pecuária e agrícola, somadas à diversidade dos biomas brasileiros (que pode colocar o país no centro da produção sustentável de matérias-primas e desenvolver alternativas nacionais que sejam competitivas, como o Licuri), e ao anúncio feito recentemente pelo Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), de que vai regular o mercado de produtos plant-based, indicam que estamos nesse caminho. Agora, o desafio é conhecer os perigos potenciais para superá-los, estabelecendo as medidas de controle eficazes para que o Brasil possa avançar na oferta de produtos de carne feitos de plantas refrigerados e estáveis em temperatura ambiente (e não só congelados). Vale destacar que o GFI Brasil vem trabalhando em parceria com o governo sob demanda das agências reguladoras MAPA e ANVISA, com o objetivo de fornecer informações científicas essenciais para o processo regulatório de produtos cárneos vegetais no Brasil envolvendo desde estudos regulatórios até o estudo de segurança alimentar.
Workshop organizado pela OMS discute aspectos regulatórios e de segurança de alimentos para o setor de proteínas alternativas

Com o desafio de alimentar quase dez bilhões de pessoas até 2050, a ONU estima que será necessário aumentar a produção de alimentos em 70% caso a população global continue a consumir proteínas animais como faz hoje. Não à toa a busca por fontes alternativas de proteínas tem ganhado cada vez mais espaço nas discussões públicas, uma vez que, além de ajudar a resolver este grande desafio, ainda cria oportunidades para o agronegócio ao incluir soluções tecnológicas como a carne cultivada e de base vegetal à indústria de alimentos. Tendo isso em vista, o Escritório Regional da Organização Mundial da Saúde para o Pacífico Ocidental (OMS/WPRO), com apoio das afiliadas globais do The Good Food Institute no Brasil, Estados Unidos, Índia e Ásia-Pacífico, realizou entre os dias 18 e 19 de maio um workshop para discutir questões regulatórias e de segurança de alimentos fundamentais para o desenvolvimento pleno do setor. Para a diretora de ciência e tecnologia do GFI Brasil, que participou da organização do evento, o Workshop representa um marco para o setor de proteínas alternativas. “As regulamentações atuais para proteínas alternativas estão aquém da demanda do consumidor e poucas práticas padronizadas ou recomendações técnicas para regulamentação internacional consistentes foram estabelecidas até agora. Uma estrutura regulatória forte é crítica para avançar ainda mais o setor e maximizar seu potencial para garantir a segurança de alimentos, mitigar a degradação ambiental e aliviar a pobreza global é fundamental. E, para isso, não podemos abrir mão dos investimentos em ciência e tecnologia”. O workshop de alto nível apresentou cientistas, especialistas em segurança de alimentos e líderes multilaterais de todo o mundo O encontro histórico, que contou com a participação de países membros da região do Pacífico, incluindo Austrália, Brunei, Camboja, China, Filipinas, Laos, Malásia, Mongólia, Niue, Papua Nova Guiné, República da Coréia, Cingapura, Ilhas Salomão, Vanuatu e Vietnã, representa um passo importante que permita aos Estados-Membros ter condições de regulamentar a produção, a comercialização e o consumo de produtos à base de plantas ou cultivados à partir de células, tanto locais quanto importados. Entre os tópicos abordados no workshop estavam: considerações de segurança de alimentos da produção de carne cultivada, visões científicas de proteínas vegetais e fermentação microbiana, insights sobre a percepção do consumidor de proteínas alternativas e um estudo de caso dos processos regulatórios inovadores de Cingapura e da Austrália. Para o Dr. Takeshi Kasai, diretor regional da OMS/WPRO, que fez a abertura do evento, transformar a cadeia de produção de alimentos com tecnologias alternativas será um desafio, mas também fornecerá grandes oportunidades. “É muito importante para nós ajudar os países a regulamentar essas tecnologias. A produção de carnes exige a expansão de pastagens e, com isso, causam desmatamento, emissão de gases de efeito estufa e levam ao aquecimento global. Estamos falando sobre comida, mas há muitas implicações em outros setores. Portanto, os países precisam ser capazes de contar com tecnologias alternativas para a produção industrial em massa de alimentos saudáveis e ricos em proteínas de forma sustentável e ecologicamente correta”, afirmou Dr. Kasai. Compreender a tecnologia e o processo por trás da produção de proteínas alternativas é essencial para criar regulamentações que protejam a saúde dos consumidores e também lhes permitam fazer escolhas. “Se temos alimentos suficientes, […] alimentos seguros, mas não podemos comercializar esses alimentos, não podemos garantir a segurança alimentar.” – Dr. Guilherme Antonio da Costa Júnior, Presidente da Comissão do Codex Alimentarius. No início deste ano, o GFI recebeu o status de observador oficial no Codex Alimentarius, um programa conjunto da FAO-OMS dedicado ao desenvolvimento de padrões globais para segurança de alimentos e comércio exterior para consumidores, produtores, processadores e agências reguladoras. Como observador, a equipe de especialistas do GFI pode agora participar ativamente do processo de definição de padrões internacionais para apoiar uma estrutura regulatória global justa e equitativa. Adaptando a regulação de alimento para um setor em franca expansão A emergência das nações em controlar a crise sanitária e de saúde provocada pela pandemia do Coronavírus também fizeram parte das exposições, especialmente pela necessidade de ampliar e diversificar as fontes proteicas de maneira segura. Ao explicar por que Cingapura se tornou o primeiro país no mundo a conceder aprovação regulatória para a venda de um produto de carne cultivada, Low Teng Yong, Diretor Adjunto de Política Regulatória da Agência Alimentar de Cingapura, reiterou que uma de suas principais prioridades é “diversificar as fontes de alimentos para garantir que o abastecimento seja resistente às flutuações [globais].” Em tempos de grande turbulência, existem grandes oportunidades, e a necessidade de mudar para um sistema alimentar mais sustentável e justo nunca foi tão clara como hoje. Como o Dr. Babatunde Olowokure, Diretor da Divisão de Segurança Sanitária e de Emergências da OMS/WPRO, declarou: “A forma como produzimos, processamos, comercializamos, preparamos e consumimos alimentos tornou-se insustentável. […] A possibilidade de produzir carne alternativa sem o abate de animais traz um benefício óbvio: reduzir impactos ambientais e problemas de saúde relacionados com o surgimento de novas doenças na interface animal-humano-ambiente. […]”. Finalizando os trabalhos, a Dra. Simone Moraes Raszl, oficial técnica da Divisão de Segurança de Alimentos, Sanitária e de Emergências do Escritório Regional da OMS para o Pacífico Ocidental, afirmou que as proteínas alternativas fazem parte da transformação por um sistema alimentar mais sustentável. “As proteínas alternativas podem ser um divisor de águas nesse processo e precisamos garantir que sejam seguras. Não há risco zero quando falamos em alimentos e precisamos ser capazes de nos basear na ciência e em evidências para abordar a segurança de proteínas alternativas e regulamentá-las adequadamente”.