As 7 tendências globais que vão dominar o setor de proteínas alternativas em 2022

Nossos especialistas globais apontam as tecnologias que devem despontar ou se fortalecer este ano com o amadurecimento da indústria e quais delas já estão acontecendo no Brasil

Texto: Bruna Corsato

Revisão: Camila Lupetti, Guilherme Vilela, Raquel Casselli e Vinícius Gallon

Após anos de crescimento constante, a indústria de proteínas alternativas caminha para uma fase de consolidação, com empresas do setor entrando em estágios mais avançados e aprimorando os produtos que chegam ao mercado. Mas ainda há espaço para crescimento e inovação, além de muitas oportunidades a serem exploradas nesse ambiente. O time de especialistas globais do The Good Food Institute apresenta quais são as tendências que devem dominar o setor em 2022.

1- A fermentação vai abrir novos caminhos para os produtos vegetais

A utilização de processos de fermentação na indústria plant-based vem crescendo como um dos pilares da produção de alimentos vegetais e a tendência é que essa posição se consolide através de lançamentos que devem chegar ao mercado em 2022.

EM 2021, a norte-americana Perfect Day criou uma proteína de soro de leite (whey protein) a partir de fermentação de precisão, técnica que utiliza microorganismos para produzir ingredientes funcionais específicos, como proteínas, moléculas de sabor, vitaminas e até gorduras. O whey fermentado chegou aos consumidores dos Estados Unidos sob a forma do Brave Robot, o serve de base vegetal da Perfect Day. Mas a lista de lançamentos que aderiram ao novo ingrediente não parou por aí: houve também o cream cheese da Modern Kitchen, mistura para bolo da Climate Hero e até novo leite alternativo no Starbucks.

A tendência é que a indústria continue a explorar essa tecnologia, aprimorando características sensoriais de produtos já existentes e criando novidades para conquistar o consumidor. As previsões de lançamentos deste ano incluem:

 A primeira proteína de ovo fermentado do mundo. A responsável pela inovação é a Every Company e chegará ao mercado através dos smoothies da Pressed Juicery.

  • A Motif Foodworks vai licenciar sua mioglobina HEMAMI para que produtores possam refinar o saber de carne em produtos vegetais
  • A empresa de carnes Hormel vai passar a incorporar a microproteína, carne feita a partir de fermentação, em sua linha vegetal por meio de uma parceria com a Better Meat Co.
  • Já no ano passado a Nature´s Fynd conseguiu aprovação do FDA para comercializar sua proteína fermentada Fy, e a previsão é de que chegue às gôndolas ainda esse ano.

Esse é só o começo, prepare-se para ouvir falar muito de fermentação no mercado plant-based em 2022.

2- Mix de tecnologias para criar produtos híbridos

Quando falamos em proteínas alternativas, estamos nos referindo a uma categoria que inclui diversos processos de produção resultando em produtos à base de plantas, de fermentação e de cultivo de células. A tendência é que esse ano vejamos produtos feitos através da combinação dessas tecnologias chegarem ao mercado, que são conhecidos como produtos híbridos:

  • Por exemplo, o Impossible Burguer é feito à base de plantas mas leva em sua composição do heme (molécula de proteínas rica em ferro) derivado de fermentação, o que confere gosto similar a carne. 
  • Muitas empresas de leite e queijo vegetais estão usando técnicas tradicionais de fermentação em nozes e outros ingredientes à base de plantas para obter o sabor lácteo autêntico e cremoso do queijo convencional.
  • Podemos esperar produtos híbridos de carne cultivada e proteínas vegetais, tanto para reduzir custos quanto para atrair consumidores que procuram recursos nutricionais como fibras. Esperamos ver ainda o lançamento de carnes vegetais aprimoradas com gordura cultivada, melhorando as propriedades sensoriais.

Além disso, deve se tornar mais comum o uso de machine learning e inteligência artificial no desenvolvimento do perfil de sabor e textura de produtos vegetais para se aproximar mais da experiência sensorial da carne tão desejada pelo consumidor. Empresas como a NotCo, Culture Biosciences e Climax Foods já estão atuando nessa direção.

3- Produtos vegetais se tornarão cada vez mais segmentados e fiéis aos produtos animais

3.1 Frutos do mar: o investimento neste setor bateu recorde em 2021, chegando a $116 milhões de dólares. Já são mais de 87 empresas no setor produzindo frutos do mar a partir de plantas, fermentação ou cultivo de células. A expectativa é de que esses produtos cheguem a lojas e restaurantes já em 2022. 

No Brasil:

  • A Fazenda Futuro lançou no ano passado o primeiro atum à base de plantas do mercado brasileiro. Disponível tanto no Brasil quanto na Europa, o produto vem pronto para consumo e é feito com soja, ervilha, grão-de-bico, azeite de oliva, rabanete e óleo de microalgas para garantir 183 gramas de ômega-3 (por 100g).
  • A linha Incrível Seara conta com iscas de peixe. Cada porção tem 12 gramas de proteína vegetal, além de ser fonte de ferro e vitamina B12, e não conter gordura trans.
  • A The New dispõe de análogos vegetais de salmão e bacalhau em sua linha de produtos.
  • A startup Sustinere Piscis, fundada pelo biólogo Marcelo Szpilman, atua para criar a primeira carne de peixe cultivada.

3.2 Cortes inteiros de carne: 2022 deve ser o ano em que vamos ver cortes inteiros de carnes vegetais se tornar realidade, contemplando uma variedade maior de preparos na cozinha. Já está no mercado o filet mignon vegetal da Juicy Marbles e a Umiami está desenvolvendo uma nova tecnologia para produzir cortes inteiros em escala.

No Brasil:

  • Incrível Seara já conta com uma linha de cortes inteiros que incluem bife, tiras de carne, cubos e filé de frango.
  • A Sadia Veg & Tal tem uma linha de frango vegetal nas opções em cubos ou em tiras.
  • A linha de produtos da Verdali inclui frango em tiras, costelinha, mignon e steak.
  • Fazenda Futuro tem uma opção de frango em cubos.
  • The New tem filé de frango e salmão.

3.3 Ovos: esta é uma das categorias plant-based que cresce mais rapidamente, com espaço para produtos como ovo cozido, clara de ovos e uma mistura para que sirva para o preparo de diversos pratos. Vemos grande potencial no uso da fermentação para produzir ingredientes de ovo que melhorem o sabor de produtos vegetais.

No Brasil:

  • A N.ovo possui um substituto de ovos para panificação e ovos mexidos
  • Ovegg e Only Veggie lançaram os primeiros omeletes de plantas do mercado brasileiro

3.4 Leite vegetal: se antes o foco de produção eram os ingredientes vegetais, agora os esforços se concentram em atingir sabor, textura e funcionalidade idênticos aos do leite tradicional. Novidades nesse sentido como o whey da Perfect Day e a caseina da Nobell Food devem avançar essa frente e ser utilizados não apenas por leites vegetais mas também em iogurte, queijo e sorvete vegetais. 

No Brasil:

  • A Vida Veg lançou uma opção de leite fresco com as mesmas quantidades de proteína e cálcio que o de vaca.
  • A Possible apresenta um leite vegetal com gosto semelhante ao leite de vaca que supre 40% da quantidade diária de cálcio em apenas um copo.
  • a Nestlé anunciou o lançamento de 12 novos produtos à base de plantas no mercado brasileiro e, entre os lançamentos, estão novas bebidas vegetais que passam a integrar a linha de lattes da marca Nescafé Dolce Gusto

4 – Aprovações regulatórias para carne cultivada estarão mais  próximas

Até janeiro de 2022, o único país a aprovar a venda de carne cultivada foi Singapura, a partir de um processo que teve início em dezembro de 2020. Entretanto, é possível quer consumidores de outras partes do mundo provem carne cultivada ainda esta ano, com o governo dos Estados Unidos trabalhando ativamente em um marco regulatório para o setor desde 2018. Diversas empresas como UPSIDE Foods, Wild Type e BlueNalu já indicaram estar prontas para comercializar produtos de carne cultivada assim que a regulamentação for aprovada.

No Brasil

  • A carne cultivada pode ser uma realidade no mercado brasileiro a partir de 2024. Esta é a previsão anunciada por duas gigantes globais da indústria de alimentos: BRF e JBS, que anunciaram investimentos significativos na produção de carne cultivada em 2021. A BRF realizou um aporte de US$ 2,5 milhões na startup israelense Aleph Farms e quer produzir carne cultivada a partirde céulas bovinas não geneticamente modificadas em 2024.
  • A JBS anunciou um investimento de US$ 100 milhões no mercado de carne cultivada, dos quais US$ 41 milhões serão destinados à aquisição da espanhola Biotech Foods e na construção de uma planta piloto na Espanha, e US$ 59 milhões destinados à implantação de um Centro de Pesquisa & Desenvolvimento (P&D) em Biotecnologia e Proteína Cultivada no Brasil, cuja inauguração está prevista para 2022. Com estas iniciativas, a empresa também espera disponibilizar ao mercado uma série de produtos com o mesmo sabor e textura da proteína tradicional em 2024.
  • Além dessas, também temos no brasil a Ambi Realfood, considerada a primeira startup de carne cultivada brasileira. Criada e liderada por Bibiane Matte, a empresa trabalha para desenvolver a primeira carne cultivada com tecnologia nacional.
  • A Gerência Geral de Alimentos da Anvisa e o Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento são os órgãos que serão responsáveis pelo licenciamento e fiscalização deste produtos. 
  • Em 2022, O The Good Food Institute Brasil vai lançar um estudo regulatório sobre carne cultivada apontando as melhores práticas a serem sugeridas aos reguladores brasileiros. O documento fornecerá argumentos de base científica para a execução das etapas da análise de impacto regulatório pelos reguladores brasileiros, que deverão se iniciar esse ano e se estenderão até 2023. Também provocará o necessário debate entre os agentes de mercado, a mídia e a sociedade civil organizada. Nós do GFI Brasil estamos prontos para esse bom debate.

5 – Sustentabilidade será prioridade para consumidores e levará a indústria a incorporar melhores práticas

A sustentabilidade é um importante motivador para o consumo de proteínas alternativas, principalmente entre os consumidores mais jovens, e seus benefícios sobre alimentos de origem animal são bem estabelecidos em fatores como uso da terra, emissões de gases de efeito estufa, uso da água e poluição.

Essa preocupação com a sustentabilidade influenciará cada vez mais o momento da decisão de compra. Vemos também investidores cada vez mais identificando que as proteínas alternativas são uma indústria chave para investimento em ESG.

Várias soluções de sustentabilidade já estão sendo exploradas por atores do setor:

  • A Luya Foods usa okara (o subproduto da produção de tofu e leite de soja) para fazer sua carne vegetal
  • A Grounded Foods reutiliza couve-flor em seu queijo à base de plantas
  • Mais instalações de processamento de plantas serão construídas em áreas que cultivam proteínas vegetais para reduzir as milhas de transporte, como a mais nova instalação da Roquette em Manitoba, Canadá, que será alimentada por hidroeletricidade
  • A nova unidade de produção plant-based da Next Meat no Japão será alimentada por energia solar
  • A nova fábrica de carne cultivada da UPSIDE Foods será movida a energia solar
  • Algumas empresas de fermentação de precisão, como Air Protein e Solar Foods, estão usando gases de efeito estufa como insumos em seus processos de fermentação
  • A energia renovável foi citada como um fator chave para manter as emissões baixas na produção de carne cultivada em uma análise do ciclo de vida encomendada pelo GFI e realizada pela CE Delft

No Brasil

  • De olho na demanda por produtos mais sustentáveis, a BRF lançou em 2021 a primeira carne à base de plantas carbono neutro do mercado brasileiro: o Veg Frango 100% vegetal, da linha Sadia Veg&Tal. Segundo a empresa, as emissões de carbono são 100% neutralizadas, desde a originação dos ingredientes até o descarte das embalagens e a compensação das emissões é realizada por meio da compra de créditos de carbono no projeto de conservação florestal nos Estados do Amazonas e Acre.
  • A Amazonika Mundi produz hambúrguer utilizando a fibra do caju que seria descartado pela indústria.

6- Empresas de proteína alternativa vão continuar a bater recordes de investimento

Com o amadurecimento da indústria, esperamos ver empresas de proteína alternativa levantando rodadas de investimento maiores à medida que mais delas entram no estágio de crescimento. O ano passado viu as maiores rodadas do setor até o momento, incluindo uma rodada Série B recorde de US$ 347 milhões da empresa de carne cultivada Future Meat Technologies, com sede em Isarel. Também esperamos ver mais IPOs (Oferta Pública Inicial) e aquisições em 2022, à medida que as empresas atingem estágios mais avançados de desenvolvimento.

No Brasil

  • A empresa brasileira Fazenda Futuro recebeu em 2021 um investimento equivalente a cerca de R$ 300 milhões, em uma rodada série C que envolveu os investidores anteriores – Monashees, Go4it Capital, BTG, Turim MFO e Enfini Ventures – e incluiu XP e o fundo europeu especializado em “foodtechs” Rage Capital. Com este aporte, o valor da empresa – que é especializada na produção de carnes à base de plantas como hambúrguer, almôndega, linguiça frango, carne moída e atum – chegou a R$ 2,2 bilhões.

7- Governos vão se envolver mais

Lideranças de todo o mundo, incluindo UE, Israel e Canadá, investiram mais de US$ 66 milhões em projetos de pesquisa sobre proteínas alternativas. Esse número é apenas uma fração dos mais de US$ 3,4 bilhões arrecadados de forma privada por empresas de proteínas alternativas apenas no primeiro semestre de 2021. O financiamento público para pesquisa é essencial para escalar o setor no ritmo necessário, e esperamos ver mais investimentos públicos dedicados a atender às necessidades de infraestrutura e pesquisa de alta prioridade que beneficiarão todo o setor.

Manter as emissões globais abaixo de 1,5 graus Celsius até 2050 é cientificamente impossível sem uma transformação no sistema de produção global de alimentos, especialmente na obtenção de proteínas para consumo humano. As proteínas alternativas são parte inexorável nessa equação por serem soluções sustentáveis, duráveis ​​e seguras, capazes de contribuir para o atingimento das metas climáticas globais.

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