A História já presenciou e validou a relevância do papel das mulheres nas conquistas científicas. Da descoberta da radioatividade à dupla estrutura do DNA, passando pela matéria escura que sustenta o universo, meninas e mulheres cumprem respeitável e significativo papel na Ciência. Em contrapartida, é notória que a participação feminina nas áreas conhecidas como STEM (expressão que, em tradução literal, significa Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática) é significativamente menor do que seus pares homens. Segundo dados do Panorama Mulher 2018 da Talenses em parceria com o Insper, 44% da mão de obra brasileira é feminina e apenas 18% destas mulheres ocupam posições de chefia. Em âmbito acadêmico, dados da ONU confirmam que menos de 30% dos pesquisadores do mundo são mulheres. No Brasil, 49% dos artigos científicos publicados são de autoria feminina, segundo informações levantadas pela maior editora científica do mundo, a Elsevier. Inspirados pelo 11 de fevereiro, data que as Nações Unidas estipulou como o Dia Internacional de Mulheres e Meninas na Ciência, o The Good Food Institute quer trazer luz para essa questão, contribuir para diminuir esse desequilíbrio e refletir sobre potenciais soluções para o futuro.
“Incluir um número maior de mulheres não se limita a equiparar o número delas ao de homens, mas também assegurar acesso às mesmas oportunidades e às condições necessárias para que elas se mantenham e prosperem na carreira científica”, afirma a Dra. Katherine de Matos, diretora de Ciência e Tecnologia do GFI Brasil. A área de pesquisa de proteínas alternativas tem revelado ser uma excelente oportunidade com resultados promissores. Tanto no Brasil quanto em outros países, as mulheres lideram as pesquisas nessa área. O GFI fomenta ainda mais esse avanço com seu Programa Anual de Incentivo à Pesquisa (Annual Competititve Research Grant Program) que financia em até US $ 250 mil estudos pioneiros capazes de elucidar os principais desafios tecnológicos da indústria de proteínas alternativas. Na edição de 2019, 56% dos projetos contemplados pelas bolsas do instituto foram propostos por mulheres, sendo três de pesquisadoras brasileiras.
Menos desperdício e em defesa do aproveitamento integral dos alimentos
O GFI apoia duas pesquisadoras que têm se destacado em pesquisas que buscam reduzir o efeito do descarte de alimentos e aproveitar a integralidade de ingredientes tipicamente brasileiros como a mandioca e o caju. A engenheira de alimentos, Dra. Ana Carla Kawazoe Sato, desenvolve um estudo na UNICAMP sobre extração e aplicação de proteínas vegetais obtidas principalmente por subprodutos agroindustriais como folhas de mandioca. A pesquisa em questão poderá atender uma crescente demanda de consumidores que querem reduzir ou deixar de consumir produtos de origens animais.
Outra cientista contemplada pelo Programa de de Incentivo à Pesquisa do GFI é a Dra. Ana Paula Dionisio. Pesquisadora da EMBRAPA, Ana Paula coordena um estudo sobre o uso da fibra de caju como ingrediente para produtos feitos de plantas. O objetivo é simular a textura e a aparência de produtos de origem animal.
Assim como na pesquisa desenvolvida pela Dra. Ana Carla, um dos principais benefícios deste trabalho é a utilização de um subproduto, geralmente descartado pela indústria. “A fibra do caju é um subproduto do processamento de suco, sendo normalmente descartado ou utilizado para ração animal. Através de tratamento adequado, esse material já se mostrou muito interessante para desenvolvimento de diversos alimentos feitos de planta, como hambúrgueres vegetais, por exemplo. Isso abre uma excelente perspectiva de uso desse produto, tanto nacionalmente como fora do país”, conta a pesquisadora.
O feijão carioca que promete revolucionar a produção de alimentos
Motivado pelo Dia Mundial dos Pulses, data comemorada em 10 de fevereiro que visa destacar a importância das leguminosas secas (pulses) como feijão, ervilha e grão-de-bico, o GFI enfatiza o trabalho da Dra. Caroline Mellinger Silva. A pesquisadora da EMBRAPA foca no desenvolvimento de ingredientes com alta concentração de proteínas a partir do feijão carioca. A finalidade é aproveitar o brasileiríssimo ingrediente e transformá-lo em uma nova opção de fonte proteica para a produção de hambúrgueres, almôndegas e outros produtos vegetais.
Atualmente, a soja é um dos ingredientes mais presentes na produção e comercialização de produtos vegetais e o Brasil é o maior produtor do mundo de proteína de soja, com uma produção estimada em 286,7 milhões de toneladas para a primeira safra 2020/21, segundo dados da CONAB. Em busca de uma maior diversidade de fontes proteicas nacionais acessíveia, a pesquisa de Caroline quer explorar a vasta capacidade agrícola nacional em produzir feijão e assegurar um melhor aproveitamento das propriedades desse ingrediente já tão presente na mesa do brasileiro. “Atualmente, o Brasil utiliza a proteína de soja e da ervilha para produzir proteínas vegetais. A ervilha é importada e é um ingrediente caro para a indústria nacional. Ter uma nova opção de fonte proteica plantada nacionalmente é excelente! Gera emprego e renda, além de prover ingredientes de menor custo para a indústria de alimentos, que poderá desenvolver produtos mais acessíveis ao consumidor final”, explica a pesquisadora.
Estima-se que as pesquisas financiadas pelo GFI sejam concluídas no fim de 2021, contribuindo com a inovação da cadeia de produção de alimentos nacional e mostrando a importância do envolvimento feminino na produção de conhecimento. “Acredito que os resultados das três pesquisas poderão inspirar outras pesquisadoras a pensarem sobre as possibilidades trazidas pelas proteínas alternativas”, comenta Dra. Katherine de Matos.
Nova edição do Programa Anual de Incentivo à Pesquisa aberta
O Programa de Incentivo à Pesquisa do GFI que financiou as pesquisas citadas acima está com as inscrições abertas para o edital de 2021 e promete conceder subsídios para as pesquisas selecionadas no valor de até US$250 mil. Este ano, a seleção do GFI terá como foco projetos que desenvolvam novos ingredientes, métodos, ferramentas e tecnologias para viabilizar a produção de cortes de carnes inteiros e frutos do mar feitos de proteínas alternativas. O Programa está na primeira fase de seleção e os interessados devem enviar sua proposta em formato PDF até o dia 10 de março de 2021 para este formulário.