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Muito Além da Soja e da ervilha: o potencial do feijão para a indústria de proteínas alternativas vegetais e para o Brasil

A soja e a ervilha são as fontes proteicas mais utilizadas na produção de alimentos plant-based, mas o feijão tem um potencial enorme de assumir maior protagonismo nesse setor. O Brasil é um dos maiores produtores globais de feijão e a maior parte dessa produção é destinada ao consumo interno, o que torna o país um dos maiores consumidores mundiais do grão. Existem mais de 40 tipos dessa leguminosa aqui no Brasil, mas o feijão preto, o fradinho, o caupi, o vermelho, o mungo e o carioca são os que dominam o mercado. O feijão carioca, sozinho, ocupa 50% de toda a área de cultivo do país. Em 2021, o The Good Food Institute Brasil (GFI Brasil) fez um levantamento com as 11 principais marcas do setor de proteínas alternativas do país e descobriu que apenas 9% dos produtos cárneos feitos de plantas levavam feijão, grão de bico ou trigo como fonte de proteína. Por mais que hoje esse número já tenha aumentado um pouco, a ampla maioria dos produtos cárneos vegetais ainda leva como fonte de proteína a ervilha ou a soja, normalmente combinadas. Assim como o feijão, a soja é um produto brasileiro – mas a ervilha, que é importada, acaba sendo um ingrediente caro para a indústria nacional. O Brasil tem uma capacidade agrícola de produção de pulses pujante que, se bem explorada, representa um potencial enorme de crescimento: o baixo custo do feijão, por exemplo, pode permitir que a indústria de alimentos desenvolva insumos nacionais mais baratos e, por consequência, produtos ainda mais acessíveis para o consumidor final. Em vez de importar concentrado ou isolado proteico de ervilha do hemisfério norte, seria possível inverter essa lógica e começar a exportar concentrado e isolado proteico de feijão brasileiro para o resto do mundo. O mesmo vale para a geração de empregos e renda: durante a produção do feijão são geradas as “bandinhas”, que são os feijões quebrados que não são vendidos para o consumidor final e que são basicamente descartados, no máximo usados para alimentação animal. É possível pensar em uma etapa de industrialização sustentável para esse processo, no qual as bandinhas sejam aproveitadas e transformadas em concentrado proteico – um produto de valor agregado – incrementando e diversificando a fonte de renda dos produtores de feijão.  Além disso, o feijão, que não é uma commodity (grão produzido produzido em larga escala e negociado nas bolsas de valores agrícolas internacionais), melhora a absorção de carbono, fixa nitrogênio no solo, demanda muito menos água e fertilizantes do que outros grãos na sua produção, tem baixo custo e é de fácil armazenamento. Ele também é riquíssimo em proteínas, fibras, aminoácidos, vitaminas e minerais. Todos esses aspectos tornam o feijão um ingrediente promissor para o setor de proteínas alternativas e para o planeta, que precisará passar por uma transição no sistema alimentar para garantir a saúde e a segurança alimentar da população global, prevista para alcançar 10 bilhões de pessoas em 2050. O produtor rural hoje em dia deixa de plantar feijão para plantar soja, milho ou cana-de-açúcar, que são commodities e têm preço fixado nas Bolsas internacionais. Utilizar o feijão é fomentar uma agricultura mais sustentável, gerando renda para as comunidades rurais através de um produto de valor agregado com alto potencial econômico e nutrindo o solo por meio de uma cultura que não poderia representar melhor o Brasil. Se realizarmos o processamento desses grãos nas cooperativas e associações de produtores, estamos falando de bioeconomia em sua essência, com potencial de abastecimento para todo o mundo. Como estamos envolvidos: A pesquisadora da Embrapa, Dra. Caroline Mellinger, conduziu uma pesquisa financiada pelo Programa Global de Incentivo à Pesquisa (Research Grant Program) do GFI, a fim de encontrar alternativas para o uso do feijão carioca pela indústria de proteínas alternativas. A pesquisa possuia dois objetivos: o de otimizar a produção de um concentrado protéico e de um isolado de feijão adequado para utilização em produtos vegetais de carne, frango e frutos do mar, e o de determinar a característica físico-química, tecnológica e nutricional dos ingredientes. Ambos objetivos foram alcançados e, com a pesquisa finalizada, o ingrediente com alta concentração de proteínas a partir do feijão está pronto para ser utilizado. Além disso, o GFI vem trabalhando junto a associações de produtores rurais no Mato Grosso e à Secretaria de Desenvolvimento Econômico do estado na elaboração de um acordo de cooperação técnica que terá por objetivo testar a viabilidade, tanto tecnológica quanto econômica, do processamento de feijão dentro das cooperativas rurais. “É uma relação ganha-ganha: o produtor passa a ter uma forma alternativa para comercialização de sua produção, com valor agregado e garantia de compra pela indústria, que por sua vez economiza ao deixar de importar parte de seu insumo do exterior. Somando a isso o potencial de melhoria nos indicadores sociais dessas regiões produtivas, o saldo da equação é extremamente positivo. Alysson Soares, especialista em Políticas Públicas do GFI Brasil

Cientistas estudam aplicação de espécies nativas do Cerrado e da Amazônia no mercado de proteínas alternativas. Conheça os projetos

Fomentado pelo The Good Food Institute Brasil, Programa Biomas tem início com estudos de sete espécies nativas que podem substituir produtos de origem animal A diversidade dos Biomas brasileiros pode colocar o país no centro da produção sustentável de matérias-primas do setor de proteínas alternativas. Com o crescimento do mercado interno de produtos feitos de plantas, 14 pesquisadores iniciam neste ano estudos sobre o uso de espécies nativas que podem ser base para análogos de produtos de origem  animal. A expectativa é que espécies da Amazônia e do Cerrado – Babaçu, Castanha do Brasil, Cupuaçu, Guaraná, Baru, Macaúba e Pequi – sejam fonte de proteínas, pigmentos e fibras que integrem outras matrizes já usadas na indústria.  As pesquisas ocorrem no âmbito do Programa Biomas, criado pelo The Good Food Institute Brasil (GFI Brasil). As espécies foram selecionadas a partir de seu potencial econômico e técnico. Mais do que apenas encontrar alternativas às fontes protéicas, o programa selecionou investigações que pensam todo o ciclo econômico da produção do ingrediente, passando pelo uso de resíduos normalmente descartados, aplicação de tecnologias limpas, e fomento às comunidades locais. Nesta edição do programa, mais de 80 propostas de pesquisa foram recebidas de cerca de 34 instituições de 14 estados brasileiros. O número mostra o avanço da pesquisa brasileira na área. Desses, o GFI Brasil selecionou 14 pesquisas. Os resultados das investigações que duram um ano serão divulgados abertamente a fim de tornar possível a aplicação e escalonamento das tecnologias desenvolvidas.  As pesquisas contribuem para consolidar a tendência de consumo de proteínas alternativas à carne, peixes e frutos do mar, leite e laticínios e ovos no Brasil, cuja demanda cresce a cada ano. O objetivo é encontrar o potencial real de aplicação desses ingredientes na indústria, desenvolvendo o mercado nacional, agregando valor às espécies nativas e promovendo o uso sustentável dos recursos naturais – caminho que leva à conservação da floresta.  Além disso, os pesquisadores buscarão identificar as características de sabor, textura, experiência de consumo, custo e nutrição de seus produtos, com foco em criar possibilidades reais de uso e consumo. “Nada melhor para a valorização do produto do que colocá-los no nosso prato e transformá-los em produtos do nosso dia a dia. Que o brasileiro possa se apropriar da riqueza que temos, que poucos têm acesso”, defende a gerente de Ciência e Tecnologia do GFI Brasil, Cristiana Ambiel.   Segundo estudo do GFI Brasil, 84% das empresas querem mais ingredientes nacionais. Na prática, os resultados podem apresentar alternativas às matrizes importadas para produtos à base de plantas, como a ervilha, que assim como a soja, domina a produção plant-based no Brasil. No cerrado, por exemplo, se estuda a possibilidade de produção de um hambúrguer totalmente feito com base no Baru. Na Amazônia, a castanha do Brasil pode ser uma fonte de proteína com maior diversidade de aminoácidos que os concorrentes estrangeiros. “A gente vê o quanto o Brasil pode ser referência em proteínas alternativas para o mundo. Lançando tendências de proteínas. Temos como desenvolver alternativas nacionais, que sejam mais competitivas, levar isso para fora do país e servir como modelo e referência no mercado”, completa a especialista em ciência e tecnologia do GFI Brasil, Luciana Fontinelle. Cristiana Ambiel também destaca que uma diversidade maior de ingredientes pode equilibrar a sustentabilidade de produtos plant-based. “O GFI já tem esse propósito da sustentabilidade, tanto é que fomenta produtos vegetais por serem mais sustentáveis que a produção animal. Mas conseguimos uma sustentabilidade ainda maior quando olhamos para a obtenção de ingredientes da nossa biodiversidade, em especial, quando visamos o aproveitamento completo das espécies nativas agregando valor às partes que são subaproveitadas como cascas, sementes e resíduos de processo”. No contexto brasileiro, desenvolver o setor de proteínas alternativas significa gerar mais empregos com a diversificação da matriz econômica. É também um passo em direção a processos economicamente viáveis ​​de produtos protéicos alternativos inovadores, que podem ser compartilhados com os atuais processos de produção de proteína animal para superar o desafio de alimentar de forma sustentável 10 bilhões de pessoas em 2050. Fabiana Queiroz, pesquisadora da Universidade Federal de Lavras, uma das contempladas pelo edital, ressalta que o Programa é fundamental para o país e que também leva à preservação dos biomas. “A preservação desses frutos depende que a gente tenha a tecnologia de processamento para que seja interessante continuar a produção deles e impedir o desmatamento”, lembra. Em qualquer cenário, é consenso entre os pesquisadores que as pesquisas devem deixar um legado de viabilidade ambiental, técnica, econômica e social para cada ingrediente, produto e processo desenvolvido. Conheça algumas das pesquisas aprovadas: PEQUI Fabiana Queiroz,  Universidade Federal de Lavras – MG Tema da pesquisa: Obtenção de ingredientes a partir da extração integral da polpa, amêndoa e casca do Pequi para aplicação em produtos plant-based Apesar de estar presente em muitos estados do Brasil, o pequi, fruto chamado de “ouro do cerrado”, pode passar despercebido e não ter suas potencialidades aproveitadas se não for resgatado na pesquisa. É o que lembra a pesquisadora Fabiana Queiroz, professora do departamento de ciência de alimentos da Universidade Federal de Lavras, que propõe extrair diferentes compostos do pequi e usá-los na produção de um hambúrguer vegetal.  Considerado carro-chefe do bioma, o pequi é rico nutricionalmente: a casca é fonte de fibras e a polpa é rica em carotenóides, com porcentagem grande de carboidratos. Na amêndoa, a abundância de óleo é acompanhada de um complexo protéico, cuja farinha desengordurada pode ser usada na produção de produtos vegetais.  Essas propriedades tecnológicas serão estudadas pela pesquisadora e avaliadas para a fabricação de produtos alimentícios. “O pequi já é explorado por cooperativas, em termos de conservas e farinhas. Estamos entrando mais na possibilidade de processamento em grande escala”, explica Fabiana. Um dos focos da equipe é também contribuir com uma produção limpa, de aproveitamento integral do fruto e capaz de atingir escala sem afetar o meio ambiente.  “Essa exploração ao máximo de todo o potencial do fruto de uma maneira ambientalmente correta é o diferencial”, afirma Fabiana.  “Não é

Fórum Brasil Bioeconomia 2021 reforça o empreendedorismo e o pensamento do ecossistema da bioeconomia avançada

O Fórum Brasil Bioeconomia 2021, organizado pela Associação Brasileira de Bioinovação (ABBI), já tem data definida: 9 de dezembro. Com o tema “Bioeconomia: Da Vocação à Realidade”, o evento, que está em sua 3ª edição, visa valorizar iniciativas que promovem a bioeconomia no país, tanto nas esferas públicas quanto privadas. Serão esperados mais de 300 representantes de alto nível da indústria, governo, imprensa, investidores, academia, ONGs, startups e sociedade civil para construir massa crítica, compromisso e ações que impulsionarão o Brasil para um novo modelo bioeconômico e bioindustrial.  O Fórum contará com a presença de Paulo Ganime, Deputado Federal e Presidente da Frente Parlamentar da Bioeconomia; Maurício Adade, CEO América Latina da DSM e Presidente do Conselho Diretor da ABBI; Ismael Nobre, Diretor Executivo do Instituto Amazônia 4.0; André Valente, Gerente de Sustentabilidade da Raízen;; Gustavo Guadagnini, Managing Director do The Good Food Institute Brasil; Gustavo Sergi, Diretor de Químicos Renováveis e Especialidades da Braskem; Kelly Seligman, Gerente de Assuntos Científicos e Regulatórios da Amyris para a América Latina e Brasil; William Yassumoto, Presidente da Novozymes para a América Latina e Thiago Falda, Presidente Executivo da ABBI. A apresentação do evento e a moderação dos debates estarão nas mãos de Luís Artur Nogueira, Comentarista Econômico e Apresentador na TV Jovem Pan News. O evento contará com dois painéis com temas estratégicos para o desenvolvimento da bioeconomia avançada no Brasil: A Bioeconomia e a Descarbonização A bioinovação (inovação baseada em recursos biológicos e renováveis) é um dos principais pilares para a redução das emissões de gases de efeito estufa e contribuição da descarbonização de várias cadeias produtivas. Importante destacar a importância da regulamentação do mercado de carbono no Brasil para impulsionar o desenvolvimento de tecnologias voltadas à sustentabilidade, além da geração de empregos e entrada de capital estrangeiro no país. A Bioeconomia e a Atração de Investimentos no Brasil A transformação econômica mundial está comprometida com o desenvolvimento sustentável e o Brasil possui diferenciais para se tornar um grande protagonista na bioeconomia avançada. A bioeconomia será destaque nas relações de comércio mundial nos próximos anos e o país precisa apresentar um ambiente estimulante ao investimento em inovação. É preciso então adotar uma estratégia de longo prazo considerando nossos diferenciais como agricultura sustentável, biomassa abundante e barata, alta experiência em biotecnologia na produção de etanol e a maior biodiversidade do planeta.  Com o patrocínio das empresas Amyris, BASF, Braskem, DSM, GFI Brasil, Novozymes e Raízen, o evento tem como objetivo discutir como converter as vocações do Brasil para a bioeconomia em realidade. Maurício Adade, presidente América Latina da DSM e presidente do Conselho Diretor da ABBI, destaca que: “A atuação da ABBI é fundamental e extremamente necessária, pois une e organiza centenas de empresas brasileiras que estão voltadas ao bem maior de, através da inovação e biociência, gerar recursos e soluções biológicos e renováveis que auxiliam a sustentabilidade de todo o planeta. O Brasil tem um papel ambiental muito relevante e potencial para fazer a diferença nas metas climáticas que foram atualizadas na COP26. Mas, é claro que o governo não consegue fazer isso sozinho, precisa do apoio tecnológico das empresas. É justamente nesta etapa que a ABBI atua estrategicamente, na facilitação das relações público-privadas.”  “A biotecnologia auxilia em todos os setores da indústria, desde biocombustíveis, consumo, agronegócios, enfim, em tudo o que a sociedade faz uso. É todo um trabalho voltado para melhorar a produção, minimizar os impactos e ajudar os produtores a fazer mais com a utilização de menos recursos naturais, como redução de consumo de água, energia, aditivos e, assim, fortalecer o desenvolvimento sustentável. As empresas são peças fundamentais na economia e no meio ambiente, por isso, as decisões de seus negócios impactam muito no âmbito social. Esperamos que a edição 2021 do Fórum & Prêmio Brasil Bioeconomia ressalte e reforce a temática, mostrando como é possível movimentar a economia de maneira saudável, garantindo o fluxo econômico e gerando empregos, e que todo esse conjunto são formas de garantir a sustentabilidade”, comenta William Matsumoto, presidente da Novozymes para América Latina. Durante o Fórum Brasil Bioeconomia acontece o Prêmio Brasil Bioeconomia 2021, que reconhece pesquisadores, empreendedores e organizações cujas soluções para as mais importantes questões do Brasil e do mundo envolvem a inovação como meio para reforçar um pacto saudável entre a natureza e a sociedade.

Quanto vale a floresta?

Há 29 anos, as Nações Unidas comemoram o dia 22 de maio como o Dia Internacional da Biodiversidade. A data visa aumentar a compreensão e a conscientização sobre a importância da diversidade biológica, além da necessidade de proteção da biodiversidade em todos os ecossistemas. Com o mote “Somos parte da solução”, a data defende a ideia de que a biodiversidade é a resposta para vários desafios do desenvolvimento sustentável. No Brasil, uma nova espécie da fauna e flora é descoberta ou descrita a cada três dias. Dados levantados pela Associação Brasileira de Bioeconomia (ABBI) confirmam o potencial do país em ser um dos maiores players do setor, considerando o fato da nação concentrar mais de 100 mil espécies animais e cerca de 45 mil de vegetais com mais de 500 milhões de hectares, 340 milhões ainda intactos, representando 20% da biodiversidade global. Motivados pelo potencial e capacidade do Brasil que é berço de uma rica diversidade, o The Good Food Institute realizou um mapeamento dos biomas da Amazônia e Cerrado para identificar produtos do extrativismo vegetal com maior potencial técnico e econômico a serem estudados em mais profundidade para transformá-los em ingredientes para a indústria de proteínas vegetais. “A biodiversidade brasileira é, ainda, pouco conhecida, negligenciada e subutilizada. Na medida em que não a valorizamos, estamos contribuindo, indiretamente, para a sua perda.”, afirma Katherine de Matos, diretora de Ciência e Tecnologia do GFI Brasil. Em primeira análise, o GFI identificou 20 produtos nativos do extrativismo vegetal na Amazônia e 13 no Cerrado. Destes, a instituição selecionou três produtos de cada bioma para uma pesquisa e estudo mais aprofundados. No Cerrado, os produtos foram a macaúba, o baru e o pequi. Na Amazônia, a castanha-do-brasil, o babaçu e o cupuaçu.  Para chegar aos resultados econômicos, o GFI considerou o número de comunidades produtoras, volume de produção e maturidade da cadeia produtiva. Para a análise de potencial técnico, foram utilizados critérios como a composição química dos produtos nativos, o potencial tecnológico e aspectos nutricionais.  “A potencialidade da flora nativa brasileira não está refletida nos supermercados, nas feiras e muito menos na cozinha do brasileiro. Como resultado, a sociedade deixa de aproveitar os benefícios decorrentes dessa riqueza. No caso das espécies de uso alimentício, por exemplo, a sociedade acaba não se beneficiando dos elevados valores nutricionais presentes nas espécies nativas. A natureza é rica, entretanto, essa riqueza precisa e deve ser usada com sabedoria. Essa pode ser a grande saída da humanidade para o futuro”, explica Cristiana Ambiel, gerente de Ciência e Tecnologia do GFI Brasil. Para se ter uma ideia, estudos realizados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) mostram que a bioeconomia, modelo econômico e industrial que utiliza matérias-primas regenerativas da biodiversidade em substituição aos recursos fósseis e não renováveis, movimenta cerca de 2 trilhões de euros e gera 22 milhões de empregos no mundo todo. Até 2030, as expectativas são de que as biotecnologias representarão 80% da produção de fármacos, 50% da produção agrícola e 35% dos produtos químicos. Conheça um pouco mais sobre os ingredientes selecionados pelo GFI e suas propriedades:  CASTANHA-DO-BRASIL  Com significativa produção nacional de cerca de 32.900 toneladas no ano de 2019 segundo o IBGE, a castanha-do-brasil in natura constitui uma favorável fonte proteica (15,60%) e lipídica (61,00%). O seu óleo possui uma boa qualidade nutricional (85% de ácidos graxos insaturados) e apresenta índices de acidez e peróxidos que atendem a legislação brasileira para óleos vegetais comestíveis. BABAÇU A produção nacional de Babaçu atingiu cerca de 48.700 toneladas no ano de 2019 segundo o IBGE, envolvendo cerca de 37 comunidades produtoras segundo a Conexsus. A amêndoa do babaçu possui 7,25 % de proteína e 66% de lipídeos. O seu óleo apresenta características funcionais interessantes por ser constituído de 83% de ácidos graxos saturados. Este produto, destinado à alimentação humana como suplemento alimentar, e, na medicina popular no tratamento de inflamações, já é produzido e comercializado por algumas comunidades.  CUPUAÇU Com uma produção de cerca de 787 toneladas no ano de 2017, segundo o IBGE, a polpa do cupuaçu é destinada à produção de diversos alimentos (polpa congelada, sorvete, geleias, etc). Dessa produção, gera-se como resíduo as sementes. A semente do cupuaçu possui 9,4% de proteína e 64,9% de lipídeos. Do óleo extraído dessa semente forma-se uma torta com altos teores de proteína (15,2%), fibras (47,6%) e lipídeos (21,0%). A torta de cupuaçu se mostra como uma alternativa para a elaboração de isolados proteicos devido a sua riqueza de aminoácidos essenciais, tornando-se uma fonte de proteína alternativa. MACAÚBA Segundo dados do IBGE, a produção nacional de Macaúba atingiu cerca de 1.178 toneladas no ano de 2018. A polpa e amêndoa de macaúba podem ser industrialmente exploradas não só como fonte de óleos vegetais, mas também como fonte de proteínas e carboidratos. Estas propriedades são desejáveis para a formulação de diferentes tipos de alimentos, com destaque para a indústria de panificação e massas e a indústria de produtos cárneos, além da importância na fabricação de suplementos alimentares. BARU A produção nacional de Baru atingiu cerca de 69,3 toneladas no ano de 2019, segundo o IBGE. A polpa do baru possui 6,0% de proteína; 41,6% de fibras; 3,4% de lipídeos e 22,5% de carboidratos, sendo comercializada, usualmente, na forma de farinha. A amêndoa possui cerca de 30% de proteína; 15% de fibras e 40% de lipídeos, sendo comercializada na forma de amêndoa torrada. O óleo da amêndoa de baru tem elevado grau de insaturação, sendo similar ao óleo de oliva e, portanto, com potencial para ser usado como óleo de cozinha.  PEQUI O Pequi tem produção nacional de cerca de 27.183 toneladas no ano de 2019. A polpa do pequi possui 3,7% de proteína; 15% de fibras e 33,4% de lipídeos. O óleo extraído da polpa se constitui de 62% de ácidos graxos insaturados. A polpa é comercializada na forma in natura, congelada e em conserva. Apesar de considerada uma proteína de baixa qualidade, é comparável à proteína da farinha de trigo, e pode ser adicionada

Bioeconomia pode levar o Brasil a liderar a produção global de proteínas alternativas

Desde os anos 1970, com a criação do Programa Nacional do Álcool, o Brasil conhece o valor da bioeconomia. Criado como oportunidade de uso da tecnologia diante da crise global do petróleo, cinquenta anos depois o país se tornou o segundo maior produtor de etanol do mundo e o maior exportador. O nome é novo, mas a ciência é antiga e tem potencial para alavancar outras áreas da economia nacional de maneira sustentável. O tema foi amplamente debatido hoje (11/9), durante o 3º Seminário Virtual da Frente Parlamentar da Bioeconomia com o tema “Amazônia: desafios e oportunidades da inovação e do ambiente de negócios.”  O Vice-Presidente Gen. Hamilton Mourão, que coordena o Conselho Nacional da Amazônia Legal, afirmou em seu pronunciamento o país deve centrar esforços no desenvolvimento da bioeconomia. “O Brasil tem que se apresentar para o mundo como potência agroambiental, ligada exatamente à questão da exploração da nossa biodiversidade. A bioeconomia na Amazônia deve mapear todos os produtos que temos lá, como o açaí, castanha, cacau e óleos vegetais, por exemplo.”.   Mourão afirmou, ainda, que o conselho tem três grandes vertentes de trabalho: proteção, preservação e desenvolvimento da Amazônia. ”Considero que o maior desafio está centrado no desenvolvimento, que requer uma ampla gama de medidas e um debate intenso para buscar o melhor caminho para a exploração econômica das riquezas da diversidade da região.”. Dentre as principais pautas da conselho estão o reforço do combate ao desmatamento e às queimadas; Fundo Amazônia, e a avaliação sobre a retomada de projetos ligados ao fundo que estão parados; recomposição da capacidade operacional de órgãos de fiscalização ambiental; e regularização fundiária. Bioeconomia A bioeconomia é um modelo econômico e industrial que utiliza matérias-primas regenerativas em substituição aos recursos fósseis e não renováveis. Dessa forma, não apenas a bioenergia se favorece dela. Com os inúmeros avanços tecnológicos e científicos, atualmente já são produzidos alimentos funcionais e biofortificados, medicamentos, plásticos biodegradáveis e muitos outros produtos e insumos.  Para se ter uma ideia, estudos realizados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico mostram que a bioeconomia movimenta cerca de 2 trilhões de euros e gera 22 milhões de empregos no mundo todo. Até 2030, as expectativas são de que as biotecnologias representarão 80% da produção de fármacos, 50% da produção agrícola e 35% dos produtos químicos. A pesquisa afirma, ainda, que 2,7% do PIB dos seus Estados-membros virão da bioeconomia. Nos Estados Unidos, já representa 5% do PIB, segundo informações das Academias de Ciências, de Engenharia e de Medicina.  Esse percentual tem potencial para ser ainda mais representativo em países como o Brasil, que tem uma grande biodiversidade de fauna e flora. São mais de 100 mil espécies animais e cerca de 45 mil de vegetais, grande parte dela se encontra na Amazônia. “A Amazônia brasileira possui mais de 500 milhões de hectares, 340 milhões ainda intactos; representa 20% da biodiversidade global. É um bioma onde ainda há muito o que descobrir. pois ali uma nova espécie é descoberta ou descrita a cada três dias. A grande questão do debate é: quanto vale a floresta? qual é o valor da floresta em termos de bioativos? Sem dúvida nenhuma é maior do que da floresta deitada, devastada se explorada de forma irracional”, argumentou o presidente executivo da Associação Brasileira de Bioinovação – ABBI, Thiago Falda. Maurício Adade, presidente do Conselho diretor da ABBI, elencou ações fundamentais para o desenvolvimento de um ecossistema estimulante para a bioeconomia avançada na Amazônia. “Devemos mapear as matérias-primas e biorecursos e desenvolver redes de distribuição e coleta envolvendo as comunidades locais; modernizar os marcos regulatórios para desburocratizar o ambiente de inovação de negócios; incentivar a interação entre a academia e o setor público, com especial atenção à pesquisa aplicada para exploração sustentável da biodiversidade local; criar mecanismos para atração de investimentos e empresas de produtos de base biológica; estimular a criação de mecanismos para participação de produtos de base renovável e soluções de baixo carbono no mercado nacional e que permitam a competitividade desses produtos no exterior”.  Diante desse potencial, um plano para implementar medidas de desenvolvimento de bioeconomia na região está em construção. O foco das atividades econômicas atuais ainda são as commodities que, apesar de atrativas por serem produzidas em larga escala, têm valor agregado baixo. Se explorados de forma sustentável, os recursos naturais amazônicos podem ter um impacto positivo transformador na economia do país e na preservação do bioma. Por meio de investimento em pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias a partir dos conhecimento acumulados por anos pelas instituições científicas locais, é possível desenvolver novos produtos alimentícios e farmacêuticos que podem tornar o país referência mundial nessas áreas. De acordo com o diretor executivo do The Good Food Institute, Gustavo Guadagnini, a indústria de proteínas alternativas tem muito a ganhar com o desenvolvimento de produtos e novos ingredientes de alto valor agregado na região amazônica que utilizam a biotecnologia. “O Brasil tem uma biodiversidade única, por isso também temos inúmeras possibilidades de gerar ingredientes inovadores com base em todas essas espécies de plantas amazônicas. O GFI acredita que uma agenda de bioinovação focada na região amazônica será um dos ingredientes essenciais para uma receita de sucesso na qual o Brasil poderá liderar globalmente a indústria de proteínas alternativas”, afirmou Gustavo. A ação integrada entre os agentes econômicos, científicos e de governo é outro fator importante para que o país assuma esse papel de liderança. Cada vez mais os produtores, indústria, governos e cientistas se unem para elaborar soluções que permitam o aumento da produção global de proteínas de forma mais sustentável. Dentre as ações possíveis podemos citar melhorias nas práticas de manejo, estudos para aumento sustentável de produtividade no campo e implementação de novas tecnologias agrárias como monitoramento de plantações por drones, agricultura de precisão e fazendas verticais. O desenvolvimento de novas fontes de proteínas é outra solução que surge na construção desse novo panorama da alimentação. Por isso a indústria de proteínas alternativas surge com tanta força: é um dos caminhos necessários para o

O que o setor de proteínas alternativas pode aprender com o de biocombustíveis?

O tema das proteínas alternativas vem chamando a atenção de cientistas, empresários, investidores e reguladores públicos no mundo todo. Não seria diferente no Brasil. O que está em pauta é uma reconfiguração do mercado de alimentos, proporcionada por inovações recentes em biotecnologia, aproveitadas pela engenharia de alimentos para desenvolver novos ingredientes e formulações. Como resultado, os produtos que chegam ao mercado têm conquistado cada vez mais consumidores desde os primeiros lançamentos no país em 2019. O êxito deve-se, sobretudo, pela capacidade da indústria em inovar na produção de alimentos análogos de base vegetal que proporcionam a mesma experiência dos produtos de origem animal quanto ao sabor, aroma e textura. O setor também trabalha para agregar ainda mais valor aos produtos por meio de preço competitivo e conveniência. Essas estratégias atingem em cheio as expectativas do flexitariano, consumidor que deseja reduzir o consumo de alimentos de origem animal, sem interrompê-lo por completo, mas mantendo seus hábitos alimentares. Boas estratégias de marketing também souberam associar características de qualidade, segurança do alimento e sustentabilidade a esta nova categoria de produtos. Basta observar a utilização de termos como “sem colesterol”, “feito de plantas”, “100% vegetal”, entre outros, presentes nas embalagens e nas campanhas das marcas.  No mesmo campo de debate, encontram-se as possibilidades prometidas pelos produtos obtidos a partir de multiplicação celular, apontando disrupções importantes nos  setores de carnes, ovos, pescados, leite e seus derivados. Soma-se a isso os riscos econômicos da necessidade de abate de rebanhos inteiros em decorrência dos surtos recentes causados pelos vírus da família HxNx e os danos à saúde pública decorrentes desses eventos. Estes elementos apontam que não é mais o caso de pensarmos em “se”, mas “quando” e “em que medida” os alimentos baseados em proteínas alternativas serão uma alternativa real em suas diversas modalidades para o consumidor. Esse será o momento onde poderemos entender o quanto será reconfigurado o mercado de proteínas de origem animal para consumo humano a partir desse processo de inovação. Mapeamentos recentes no Brasil e no mundo já apontam algumas tendências. Uma delas é o volume crescente de investimentos em startups, ao mesmo tempo determinante e determinado pelo aumento do número de novas empresas ano a ano. Outra tendência é a montagem de unidades de negócio de proteínas alternativas nas empresas já em atividade no mercado da proteína animal, inclusive nas de grande porte. Por fim, parece clara a mobilização e a especialização da cadeia de ingredientes para atender a demanda destes novos negócios.  O debate sobre as proteínas alternativas ganha força no momento atual. Assim como os biocombustíveis e a química de renováveis durante a primeira década deste século, a discussão sobre as tecnologias envolvidas e sua entrada no mercado dependem de fatores como investimentos, reações dos atores econômicos atuais, regulação e apoios governamentais. Há desafios muito semelhantes. Primeiramente, o de tornar o produto final competitivo em custo e acesso em relação aos produtos de origem animal, entregando uma experiência sensorial e de sabor semelhantes. O desafio envolve a execução em larga escala de um processo produtivo baseado em uma nova tecnologia e a solução das questões técnicas e econômicas relacionadas a esse volume de produção.  Em seguida, a necessidade de um marco regulatório favorável à inovação, fundamental para um ambiente de negócios saudável e atrativo. Se no caso dos biocombustíveis os agentes econômicos anteriores atuavam no passado sobre marcos regulatórios e mecanismos de benefícios fiscais consolidados durante décadas, o mesmo ocorre com as proteínas alternativas hoje em dia. A demanda pela atualização do marco regulatório para produtos a base de plantas e obtidos por fermentação e a criação de um marco regulatório para produtos obtidos por multiplicação de células, tanto em âmbito nacional (pelas agências regulatórias de cada país) quanto internacional (no Codex Alimentarius) está colocada e é uma necessidade natural advinda de uma inovação disruptiva dessa magnitude. Por fim, o desafio de definir a melhor estratégia de negócios na transição da fase de demonstração do produto para a produção e comercialização efetiva. O desenho de negócios, especialmente o investimento em plantas produtivas e estruturas de distribuição, é fortemente afetado pelo grau de maturidade das tecnologias capazes de entregar os produtos desejados. Neste sentido, algumas empresas de carne cultivada tem optado por inicialmente desenvolver análogos de carnes raras de baixo volume e alto valor de mercado. Exemplo semelhante ocorreu com a recomendação para o setor de biocombustíveis e química de renováveis considerar a produção de especialidades em vez de commodities durante o processo de escala de produção.  Como procuramos demonstrar, há paralelos importantes entre o momento atual do setor de alimentos feitos a partir de proteínas alternativas e o cenário do setor de biocombustíveis e química de renováveis no início deste século. Entre os aprendizados mais relevantes que podem ser trazidos de um cenário para o outro está a necessária capacidade de adaptação dos modelos de negócio e suas cadeias produtivas. Isso implica em diversificar as opções tecnológicas, antecipando e mitigando eventuais falhas ou mudanças de percurso durante o processo de escala. Além disso, desenvolver uma cadeia de fornecimento robusta em vez do desenho de negócios verticalizados pode ser uma opção capaz de minimizar a necessidade de investimentos fixos e ao mesmo tempo ajudar a lidar com variações inesperadas de preço dos produtos análogos, operados hoje dentro das regras dos mercados de commodities. O Brasil pode se tornar protagonista no cenário atual das proteínas alternativas, desenvolvendo novas cadeias produtivas no setor de alimentos, intensivas em tecnologia e de alcance global. Os alimentos de base vegetal e os obtidos por multiplicação celular representam uma enorme oportunidade para produtores, empresários e o setor produtivo como um todo. O futuro da alimentação passa por pensarmos o alimento do futuro sob a ótica da bioinovação. Autores Raquel Casselli – Comunicadora Social, especialista em Sustentabilidade e gerente de Engajamento Corporativo no The Good Food Institute Brasil Alexandre Cabral – Sociólogo, Mestre em Propriedade Intelectual e Inovação, assessor de políticas públicas no The Good Food Institute Brasil Texto originalmente publicado no site da ABBI – Associação