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Meio ambiente

Não existe futuro climático sem um sistema alimentar resiliente: o que aprendemos em Bonn, no “esquenta” para a COP 30?

11 de julho de 2025

Crédito da imagem: UNclimatechange, CC BY-NC-SA 2.0

Em junho, a cidade de Bonn, na Alemanha, foi palco da 62ª sessão da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (SB62), uma espécie de “ensaio diplomático” que antecede a realização da trigésima Conferência das Partes (COP) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), marcada para novembro, em Belém (PA).

Representado por Mariana Bernal, analista sênior de políticas públicas, o The Good Food Institute Brasil esteve presente como um dos observadores da UNFCCC. Confira os principais destaques.

Bonn 2025: bastidores dos processos de negociação

O GFI Brasil continuou seu trabalho no âmbito do Sharm el-Sheikh Joint Work on Agriculture (SSJWA), onde já havia contribuíndo, em parceria com organizações animalistas aliadas, com submissões em parceria para políticas de alimentação baseada em vegetais.

Mas o que é o SSJWA? Essa iniciativa de quatro anos estabelecida em 2022, em Sharm el-Sheikh, no Egito (durante a COP 27) – dedica-se à implementação de ações climáticas no setor agrícola e de segurança alimentar.

Durante a COP29, no Azerbaijão, as entidades vinculadas apresentaram um portal online para exibir essas ações. Países-membro e Organizações da Sociedade Civil (CSOs), como o GFI, foram convidados a participar.

Em Bonn, por sua vez, o foco do SSJWA baseou-se em abordagens sistêmicas e holísticas para implementar ação climática em agricultura, sistemas alimentares e segurança alimentar, assim como compreensão, cooperação e integração em planos. Para o SB64, programado para junho de 2026, o segundo workshop do grupo será sobre acesso a meios de implementação para ações climáticas na agricultura e segurança alimentar, incluindo o compartilhamento de melhores práticas.

No dia a dia dos países, isso inclui temas como:

  • Finanças e tecnologia;

  • Abordagens sustentáveis (agroecologia, agricultura climaticamente inteligente, práticas regenerativas, etc.);

  • Integração em estruturas nacionais (NDCs, NAPs, TNAs, etc.);

  • Capacitação e acesso a financiamento;

  • Coordenação entre órgãos e fundos da UNFCCC;

  • Gestão de riscos, incluindo sistemas de alerta precoce;

  • Sustentabilidade do sistema alimentar vinculada à mitigação.

Cabe destacar que o trabalho junto ao SSJWA é essencial para o futuro das proteínas alternativas a nível global. Durante o workshop, o GFI Brasil articulou-se com negociadores da agricultura, além de apoiar uma redação que fosse, de fato, capaz de considerar o sistema alimentar em sua totalidade – incluindo o avanço das proteínas alternativas como estratégia climática fundamental.

“Essa perspectiva representa um avanço nas discussões da UNFCCC. Em vez de tratar apenas setores isolados, buscamos integrar áreas como agricultura, energia, transporte e indústria, além de todos os estágios da cadeia alimentar — do plantio e processamento à manufatura, armazenamento, comercialização e consumo”
Mariana Bernal
Analista sênior de políticas públicas do GFI Brasil

O evento em Bonn também foi marcado por discussões sobre o Global Goal on Adaptation (em tradução livre, “Meta global de adaptação”), nas quais o GFI atuou junto a grupos de negociadores para manter indicadores relacionados a sistemas alimentares no radar — ainda que o texto final tenha ficado sem consenso.

Além disso, a 4ª Carta da Presidência da COP 30 foi publicada durante a SB62, apoiada por um briefing da Presidência sobre a Agenda de Ação e um briefing logístico durante as sessões. A agricultura e os sistemas alimentares foram incluídos no item 3 da agenda oficial, apresentando os seguintes subtópicos: restauração da terra e agricultura sustentável, sistemas alimentares mais resilientes, adaptáveis e sustentáveis e acesso equitativo a alimentos e nutrição adequados para todos.

Conferência coproduzida pelo GFI Brasil

No segundo dia de evento, em parceria com Proveg e PAN International, o GFI Brasil coorganizou a conferência Future proofing food: Is protein diversification the key to healthier and sustainable food policies? (em tradução livre, “Alimentos à prova de futuro: a diversificação de proteínas é a chave para políticas alimentares mais saudáveis e sustentáveis?”).

Apesar do espaço menor oferecido pela UFCCC na programação dedicada a conferências paralelas, o Future Proofing Food reuniu representantes do EIT Food, do Ministério da Alimentação, Agricultura e Pesca da Dinamarca e da Proveg, além de 30 participantes na plateia (incluindo representantes da Fundação das Nações Unidas e da própria Convenção-Quadro da ONU).

Na apresentação, destacamos a importância do texto Carne de origem vegetal e alimentos ultraprocessados: o que os profissionais de saúde precisam saber, elaborado pelo GFI Europa e a PAN Internacional. Enfatizamos, também, os desafios e oportunidades para ampliar a adoção de proteínas alternativas no Brasil, em um contexto de políticas alimentares mais saudáveis e sustentáveis.

Side Event Future proofing food: Is protein diversification the key to healthier and sustainable food policies? (Bonn, 2025).

Caminhos para a COP e a Declaração de Belém por Dietas Ricas em Plantas

Por fim, junto a diversas organizações que atuam no setor – a ProVeg International e Plant Based Canada são alguns desses nomes –, o GFI Brasil assinou a Declaração de Belém por Dietas Ricas em Plantas.

A carta divide-se em 5 pontos essenciais: 1) Mitigação da crise climática; 2) Benefícios na saúde pública; 3) Proteção à biodiversidade; 4) Segurança e resiliência alimentar; e 5) Benefícios econômicos. Ela também chama atenção de governos para o fato de que dietas tradicionais do Sul Global são responsáveis por alimentos ricos em fibras e à base de plantas, e cobra ações diretas que ajudem a promover sistemas alimentares mais saudáveis e resistentes ao clima.

“Com a próxima COP acontecendo no Brasil, temos a chance de liderar o debate global sobre sistemas alimentares resilientes ao clima. A Declaração de Belém é um chamado claro para que os governos apresentem compromissos e planos concretos até 2027”, enfatiza Bernal.

Essa declaração ganha uma urgência ainda maior quando se considera que os sistemas alimentares geram cerca de um terço (34%) das emissões de gases de efeito estufa no mundo e representam 74% das emissões totais do Brasil. Nessa conjuntura, as proteínas alternativas têm a capacidade real de adaptação climática, podendo poupar 12% das terras agrícolas do mundo e frear o desmatamento.

Confira um trecho:

“Tendo em vista a próxima Conferência das Partes da UNFCCC no Brasil, apelamos aos Estados-Membros da ONU para que:

  • Estabeleçam Planos de Ação Nacionais para Alimentos à Base de Plantas, a fim de promover dietas saudáveis e sustentáveis – da fazenda à mesa – com o objetivo de aumentar a segurança alimentar e a resiliência, melhorar a saúde pública, mitigar as mudanças climáticas, proteger e restaurar a biodiversidade, proporcionar benefícios econômicos e garantir a coerência das políticas.
  • Comprometam-se com um prazo para a publicação dos Planos de Ação Nacionais para Alimentos à Base de Plantas a tempo de serem apresentados para discussão na COP32 em 2027.
  • Comprometam-se a apoiar financeiramente a implementação dos Planos de Ação Nacionais para Alimentos à Base de Plantas a partir dos orçamentos de promoção agroalimentar.”

Referências:

  1. Crippa, M., Solazzo, E., Guizzardi, D. et al. Food systems are responsible for a third of global anthropogenic GHG emissions. Nat Food 2, 198–209 (2021). https://doi.org/10.1038/s43016-021-00225-9
  2. Alencar, A., Zimbres, B., Souza, E., Tsai, D., Silva, F. B. e, Quintana, G. de O., Graces, I., Coluna, I., Shimbo, J. Z., Carvalho, K., & Potenza, R. F. (2023). Estimativa de emissões de gases de efeito estufa dos sistemas alimentares no Brasil. Observatório do Clima.
  3. Kozicka, M., Havlík, P., Valin, H., Wollenberg, E., Deppermann, A., Leclère, D., Lauri, P., Moses, R., Boere, E., Frank, S., Davis, C., Park, E., & Gurwick, N. (2023). Feeding climate and biodiversity goals with novel plant-based meat and milk alternatives. Nature Communications, 14(1), 5316. https://doi.org/10.1038/s41467-023-40899-2

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